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domingo, 14 de janeiro de 2018

Da Califórnia - João Bendito


PERDI A MINHA CARTEIRA!!!

É uma sensação esquisita, quando metes a mão ao bolso e... a carteira não está lá!
A cabeça começa logo a andar à roda. Apalpas as algibeiras todas duas ou três vezes, olhas para o chão, tentas lembrar-te por onde andaste, os últimos lugares onde a poderás ter usado. E nada.
Aconteceu-me no outro dia. Fui a uma loja de ferragens comprar umas bugigangas para um projeto que estava a fazer para os meus netos. Por sinal era uma loja onde eu, até umas semanas antes, também lá trabalhara, portanto todos me conhecem das portas para dentro. Depois de pagar, entrei no meu
carro e dirigi-me a uma outra loja, no mesmo complexo. Encontrei as coisas que me faltavam e tomei o meu lugar na fila para pagar. Boto a mão à carteira e... senti um buraco a abrir-se sob os pés.
Volto para o carro e rebusco debaixo dos assentos, entre os assentos, ajoelho-me ao lado do carro e a barriga começa a acompanhar a cabeça, a dar voltas enriçadas. Regresso ao meu antigo posto de trabalho e conto o sucedido, dois ou três dos meus ex-colegas ajudam-me na busca, que resulta infrutífera. Imaginem que até o “big boss” veio à rua espiolhar entre os carros e as pequenas zonas ajardinadas. Em casa, depois de ouvir um raspanete da patroa porque “só não perdes a cabeça porque Deus inventou o pescoço”, sentei-me em frente do computador para começar a cancelar cartões de crédito, pedir que me mandassem cópias de cartões da segurança médica e fazer uma marcação para ir renovar a carta de condução. Quem já passou pelo mesmo, sabe como é. Sentimo-nos como que violados, inseguros. Será que alguém a encontrou e, por maldade, nem tentou a devolução? Será que alguém vai fazer uso da minha identificação e, um dia destes, tenho à porta mais um grande sarilho? Pode parecer mentira mas uma vez aconteceu-me um caso parecido. Não perdi a carteira mas esqueci-me só de recolher o cartão com que tinha feito o pagamento e, dois dias depois a minha conta bancária já tinha sido debitada em mais de seis mil dólares! Foi mesmo o dono da loja que tinha usado o meu cartão e comprou na internet uma série de produtos para vender. Felizmente o banco tratou do assunto de uma forma exemplar e o meu dinheirinho voltou à minha conta. Tinha que me lembrar deste episódio, logo agora, para aumentar a minha angustia.

Realmente, a angustia que senti só se me comparou à que me acometeu quando eu tinha uns dez anos de idade e perdi a minha primeira carteira. Já estou a ouvir as vossas vozes, “Poça, passas a vida a perder carteiras!” Até nem era bem uma carteira, já que, nessa idade, não tinha necessidade de andar com documentos e, dinheiro de papel... era vê-lo! Refiro-me a uma daquelas bolsinhas, de plástico, de forma elíptica, que a gente tinha que apertar nos dois extremos ao mesmo tempo para a abrir. A minha era preta, com um emblema da Académica de Coimbra, o meu clube de futebol favorito (na altura). Tinha sido comprada na Praça Velha, àquele vendedor ambulante continental que lá montava uma mesinha e vendia pentes e esferográficas ao preço da uva mijona. Servia para ir guardando as “baratinhas” que o meu Pai me dava, nas tardes de domingo, depois do jantar familiar.
Essa, porém, eu sei como e onde a perdi. Foi ali junto da muralha da baía de Angra, um pouco mais à frente da Praia do Galeão. Tinha o costume de andar às voltas com a correntinha ao redor do dedo indicador e, zás, saltou-me pela mão fora e foi direitinha para o mar. Nunca mais a vi. Estão agora a ver a minha angustia, perdi a minha fortuna num abrir e fechar de olhos.
Voltando aos nossos dias, devo acrescentar que, depois da trabalheira que tive em renovar cartões e outras coisas mais, dois dias depois recebi um telefonema do meu antigo patrão a dizer que a minha carteira estava, sã e salva, no cofre da loja. Alguém a encontrou e devolveu a um dos supervisores que, ao ver a minha foto, a guardou porque, como nem sabia que eu já não trabalhava lá, ma iria entregar no dia seguinte. Um pequeno pormenor de falta de comunicação.
Desta vez até nem perdi dinheiro nenhum porque já é raro andar com dinheiro na carteira. E trocos muito menos. Hoje em dia já fazemos a nossa vida diária a toque de cartões e transações virtuais, até podemos fazer as compras no supermercado e só pagar com um deslizar do telemóvel. Mas a minha carteirinha preta, a que está a fazer companhia aos galeões afundados na baía de Angra, nunca mais me esqueci dela. Todas as vezes que passava naquele lugar, eu sentia a minha fortuna a sair-me pelas mãos fora.
Talvez por isso nunca cheguei a ser rico e de pobre não passarei.
Pudera, a perder carteiras desta maneira...
Lincoln, Ca. 22 Setembro, 2016
João Bendito


Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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