A SENHORA DA LUZ E O PADRE JÚLIO
Segundo o testemunho de S.Lucas, inserto no capítulo 2 e versículos 22-24 do
seu Evangelho, passados os 40 dias após o nascimento do Menino Jesus, e em
cumprimento da lei mosaica, José e Maria dirigiram-se ao Templo em Jerusalém,
(embora fosse permitido fazê-lo na sinagoga local em Nazaré), a fim de se
submeterem às respectivas cerimónias da purificação do pai e da mãe, (embora a
lei mosaica nunca menciona a purificação do marido, mas apenas da esposa), e
concomitantemente a fazer a apresentação do bébé perante Deus, seguindo-se o
resgaste através da oferta (no caso dum casal pobre) de um par de pombas ou
pombos.
A celebração litúrgica deste evento toma lugar, anualmente, no dia 2 de
Fevereiro, atingindo especial solenidade em determinadas localidades açorianas,
onde Nossa Senhora é, popularmente, mais conhecida por outros títulos, todos
eles revestidos em termos carinhosos, mas em piedosa referência à Festa da
Purificação de Maria.
E assim temos, por exemplo, Nossa Senhora da Estrela como padroeira da Matriz
da Ribeira Grande, na ilha de S.Miguel, onde igualmente encontramos a freguesia
dos Fenais da Luz com Nossa Senhora da Luz, investida no seu manto de
padroeira, que ainda se extende à freguesia da Luz na ilha da Graciosa.
Na consequência desta festa da Purificação, são atribuídas a Nossa Senhora
outras invocações, tais como: Nossa Senhora da Expectação, da Esperança, da Boa
Hora, do Parto, do Leite, etc.
Embora a representação mais comum, e mais conhecida hodiernamente, de N. S. da
Purificação seja aquela que nos mostra a Senhora com o seu Menino, colocado
quer nos braços quer nos joelhos... o certo é que, ANTIGAMENTE, ela aparece-nos
representada com um seio entreaberto a amamentar o seu Menino!
Esta «cena» é, certamente, inspirada no texto evangélico de S.Lucas, (capítulo
11, versículo 27), onde se lê o seguinte:
«Enquanto Jesus falava, uma mulher de entre a multidão gritou e disse:
«Abençoado o ventre que te trouxe e os peitos que te amamentaram!»
Daqui evoluíu, e tomou alento, a ideia de representar Nossa Senhora no «estado»
de gravidez... sem o Menino, claro!
E dest'arte «nasceu» a imagem de Nossa Senhora de ventre volumoso, redondo e
saliente, cabendo-lhe o título de «Virgem Paritura» ou Nossa Senhora
Parturiante... título este totalmente alicerçado em textos bíblicos, remontando
às profecias do Velho Testamento, apontando que a «Virgem conceberá e dará à
luz um filho».
A este respeito, o Padre Júlio da Rosa, digno pároco da igreja de N. S. das
Angústias, (Horta, Faial), publicou um bem elaborado artigo no «Correio da
Horta» (24-Dez.-97), assinalando que, «esta visão humana da mulher (grávida)
foi tomada receosamente como possível deturpação do divino; e assim foram
retiradas dos altares muitas e valiosíssimas imagens medievais, em pedra,
mármore, madeira e mesmo em telas e frescos, o que empobreceu grandemente o
património cultural da Igreja e da Humanidade.»
Em Portugal - prossegue o Padre Júlio - «ou por pudicícia exagerada, ou por
acharem grotesca a deformação do ventre, os eclesiásticos fizeram desaparecer
muitas dessas imagens, enterrando-as nos adros, ou modificando as esculturas e
alterando as telas e os frescos, com véus e outros arranjos pictóricos.»
Nos Açores, pouco ou nada temos de concreto acerca destas e semelhantes
remodelações. Mas, nos finais do século 19, segundo a informação do Padre Júlio
da Rosa, tivemos um bispo que, durante a sua visita pelas paróquias do
arquipélago, «foi indicando e apontando algumas imagens que, menos artísticas
ou deformadas se expunham, fossem retiradas.»
No entanto, reza a História que os primeiros povoadores flamengos, ao chegarem
à Ilha do Faial, construíram uma pequena ermida, no vale da «Ribeira dos
Flamengos», mesmo à ilharga da Grota da Senhora da Luz, e ali colocaram uma
pequenina imagem da Virgem, que o Padre Júlio carinhosamente apelida de Nossa
Senhora D'À Luz, aquela que em verdade «dá luz», e cuja intercessão era
suplicada pelas primitivas mães parturientes, pedindo a graça duma Boa Hora
p'ró parto dos seus «bébés» e futuros Açorianos!
Ó Mãe, se uma
balança, como eu penso
Existe no teu mundo - a Eternidade -
Mãe! Põe dum lado o teu amor imenso
E do outro lado põe: a minha saudade.
Pe. José A. Ferreira
San Leandro, Califórnia
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