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485º Aniversário da Cidade de Angra do Heroísmo

domingo, 24 de março de 2019

Do professor, pesquisador, historiador, jornalista, Vítor Rui Dores


Do ecletismo musical dos Bandarra

Os Bandarra são amadores porque não fazem da música uma profissão. São amadores mas não lhes falta uma consciência profissional. Amam o que fazem e, sendo universais a partir da ilha do Faial, tocam juntos por puro prazer.
O segundo trabalho discográfico desta banda intitula-se “Bicho do Diabo” (2012) e tem pré-produção, produção, gravação e mistura de António Bragança. Recorde-se que o primeiro disco do grupo (“Bandarra”, 2010) constituiu uma surpresa musical no contexto regional e nacional, tendo sido nomeado para a 1ª edição dos Prémios Megafone, que levou a banda até ao palco do Centro Cultural de Belém. De então para cá, os Bandarra têm feito uma série de concertos, dentro e fora dos Açores, afirmando-se musicalmente e merecido elogiosas críticas de alguma comunicação social de referência: ”Visão”, “Expresso”, “JL”, entre outros.
 “Bicho do Diabo” reúne catorze temas originais, com letras de Miguel Machete, sendo a música e os arranjos da responsabilidade dos elementos do grupo. 
Numa primeira audição, o que salta ao ouvido são as cores tímbricas com que Miguel Machete enriquece e distingue as interpretações. Não soa tudo ao mesmo como tantas vezes acontece em álbuns que procuram uma unidade. Pelo contrário: o universo musical dos Bandarra busca uma variedade, aqui residindo a sua imagem de marca, a sua identidade musical.
Sem perder de vista o legado da música tradicional portuguesa (e, dentro desta, a de expressão açoriana, com olhares à fraseologia popular das ilhas), os Bandarra apostam num ecletismo musical que vai da música popular urbana à música portuguesa, céltica e balcânica, viajando, neste e no primeiro trabalho discográfico, pelo fado, pop, rock, afro, reggae, gypsy e blues.
Neste cocktail sonoro, destaque para a boa batida, isto é, a boa onda da melodia, da harmonia e do ritmo. São cantigas muito cénicas (“A Foliona”) que questionam o real (“Mais ou menos minuto”), denunciam a pardacenta rotina (“A Feira”), interrogam os dias incertos (“Bicho do Diabo”) e são um grito contra o imobilismo e o ensimesmamento (“Zé”). E tudo isto nos é dado em doses de subtil ironia e com olhares críticos à sociedade. 
Rendo-me incondicionalmente a estes “seis mafarricos” (“Batata”, “Gira”, “Fausto”, “Chinês”, “Lau” e Pietá” – já lhes chamei trovadores e arlequins dos nossos dias) que estão a tocar cada vez melhor. E que variedade de instrumentos – até o mozartiano “glockenspiel” utilizam. O Miguel Machete está em grande forma, com a sua “acting voice” e uma imaginação transbordante. Gostei particularmente de “Não és dos nossos”, cantada com macios afagos harmónicos – belíssimo poema e belíssima canção. Notável é também a “Canção expiração” que nos fala da angústia dos bloqueios criativos. Mesmo uma música aparentemente orelhuda como “Vamos à Praia” (que para além do seu sentido semântico, é também um mando da Chamarrita) tem muito que se lhe diga em termos de composição.
O disco termina com um convite breve para que o outro visite a ilha.
Com boa captação, bons arranjos e em edição cuidada em termos gráficos, “Bicho do Diabo” é um disco extremamente variado e de ambiente enérgico. Para fruir alto e em bom som.
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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