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Tributo
a Marcolino Candeias
Por Lélia Pereira
Nunes
Cerca de dois meses ou mais recebi um
convite do escritor Onésimo Teotónio Almeida, lá de Providence, para escrever
um pequeno texto em homenagem ao poeta terceirense Marcolino Candeias, a
lembrar da geração que fez furor nos anos de 80 e 90. Fiquei muito
sensibilizada com a lembrança de alinhar ao lado
de nomes das Artes e Letras
açorianas de dentro do arquipélago e de outras geografias. Amigos de um chão
telúrico comum, de muitas aventuras por terras da diáspora, de sonhados
projetos e mil ideias debatidas a exaustão noite adentro. Aceitei botar a
palavra na reverência à obra poética e literária do Marcolino Candeias, de me
associar a esta corrente de amizade e de reconhecimento a sua criatividade
literária e d’artes. Nem parei para pensar se havia gente muito melhor
qualificada do que eu para falar do poeta considerado uma das vozes mais
importantes do grupo «Geração Glacial». Ou, do seu jeito doce, elegante e
apaixonado de declamar «Aqui não tem sabiá», dedicado a sua Deka – uma
brasileira do Paraná que há muito conquistou o seu coração e inspirou versos de
imensa ternura.
Neste domingo, 1° de maio recebi a triste notícia de sua partida.
Muitas foram as mensagem deixadas na rede social do Facebook numa última
homenagem ao Amigo Marcolino ou ao «Angra Brother», como o escritor Diniz
Borges gosta de chamá-lo.
Lembro-me do texto que escrevi a convite do Onésimo, no passado
fevereiro, «Madalena vem à Ceia», onde brinquei em torno da fotomontagem «Felix
Et Amici Cena», impagável leitura da famosa pintura «A Última Ceia»(1497) do
gênio renascentista Leonardo Da Vinci, criação do genial Marcolino. Peço-lhes
licença para reproduzir dois parágrafos do que escrevi naquela oportunidade:
Atrevido na sua arte, irreverente e estiloso, Marcolino deixa
transparecer um ar de motejo, o espírito gozador típico do ilhéu. Seus dedos
flanam livres ao compor com lirismo telúrico a cena sagrada do cenáculo
açoriano num inegável tributo ao poeta Emanuel Félix. Seu olhar arguto se
debruça sobre as sutilezas de cada personagem sentada na grande mesa da
açorianidade. Doze convivas reunidos em torno do Mestre Emanuel Félix, em
íntima comunhão de ideias, de diálogo liberto, frontal, democrático.
Identifico-os – a irmandade atlântica de escritores, ícones da literatura e
artes açorianas. Merece a eternidade.
É evidente que não faço parte desta Ceia. Tal qual a Maria
Madalena que não estava sentada ao lado direito de Jesus, também não sentei
naquela grande mesa. Fiquei para sempre cheia de inveja e com muita saudade
pelo que nunca partilhei.
Neste 1° de Maio de 2016 retorno ao cenário daquela famosa Ceia
sem qualquer esperança de ser incluída, de sentar à mesa junto aos amigos,
cumplices de vivências e afetos, porque Marcolino Candeias já não pode mais
atender ao meu pleito e portanto – «Madalena não vem à ceia».
Fica a saudade da memória vivida, do seu inconfundível lirismo, na
alegria brejeira de cantar o amor ou fazer um breve discurso aos seus amigos e
recitar: «Oh! Meus amigos de café de cerveja gelada e coração fervente/ que
resolvíamos a paz e a guerra e inventávamos a justiça social/todos os meus
amigos das artes que sonhávamos até o clímax da fúria/ a utopia suprema/ e
expurgámos do mal todo o universo para fazer só de beleza.»
Fica a certeza de que a palavra do poeta não silencia jamais.
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