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sábado, 2 de fevereiro de 2019

De Rui Almeida Jornalista da Deutsche Welle


“FAROL DE NEVOEIRO” – 3 fevereiro

Haverá comunicação sem audiências?...


O facto: rádio e televisão a quem a quer e sabe fazer

Independentemente das guerras de audiências, contratação de vedetas a peso de ouro ou estratégias de contra-programação que marcam o quotidiano das estações privadas e, portanto, necessitando de dotar as suas estruturas de orçamentos fortes e competitivos, há uma regra transversal ao trabalho e à gestão, no universo televisivo: não pode haver canais de televisão sem audiências. O público é o motivo, o destino mas também a justificação última do trabalho dos profissionais e, no limite (pelo menos em tese…) da existência e da sobrevivência dos canais. Muito mais esta regra se aplica quando se trata de serviço público, onde o dinheiro que todos nós descontamos é aplicado no financiamento das produções e das infraestruturas físicas e técnicas, mas também nos salários dos profissionais. 

Os dirigentes dos canais públicos têm, portanto, uma especial responsabilidade e um redobrado dever: a especial responsabilidade de gerir dinheiros que a todos pertencem, tendo sempre em consideração a parcimónia da aplicação dos recursos disponíveis em face das necessidades mas, essencialmente, das vontades e dos gostos dos públicos a quem o produto do seu trabalho se destina. O vencimento que lhes é pago por todos deve ser valorizado, portanto, na medida exata do cumprimento dos anseios de todos, e nunca dos caprichos pessoais ou dos interesses setoriais ou de grupo.

Mas têm também o redobrado dever de perceber para quem trabalham e com quem o fazem. O dever de gerir os recursos humanos de acordo com os estímulos, o “feedback”, as características e a reação que os seus profissionais provocam no mercado. Só bons profissionais geram boas audiências, e a repetição gasta de modelos imitativos é um caminho perigoso e pantanoso. Compreender quem o público quer ver, quais as mensagens que melhor colhem, e aqueles que melhores condições têm para o fundamental “piscar de olho” gerador de simpatias e empatias é, portanto, não a missão, mas o tal especial dever dos gestores de canais públicos de televisão. 

Estas regras, sendo universais e guiadas pelo bom senso, têm particular aplicação nos Açores. Sejamos claros: no universo da RTP Açores. Com audiências quase residuais, ou, no mínimo, muito aquém do exigível (que, à luz de uma qualquer leitura eminentemente economicista seriam objeto de reavaliação e, até, de reestruturação profunda…) os canais públicos de rádio e, sobretudo, de televisão devem procurar perceber, com a urgência que o uso de dinheiros públicos determina, os públicos-alvo, os produtos que lhes servem e que correspondem aos seus anseios, e, acima de tudo, as pessoas que podem cumprir esses desígnios. A dedicação, a disponibilidade e a competência, infelizmente, não abundam em muitos setores. Nos “media” açorianos – e escrevo-o com o máximo respeito por todos os que neles labutam mas, desculparão, com a absoluta autoridade que a carreira e a experiência me conferem – talvez ainda abundem menos. 

Compete aos decisores terem noções claras dos caminhos a seguir: por onde e para onde. Como e com que meios. E (o mais importante) com quem. Tratar bem, planear, organizar e jamais negligenciar as qualidades, vontades e disponibilidades dos recursos humanos é o primeiro caminho para garantir algo fundamental: um espírito de união e foco que, sendo imprescindível, de outra forma será dificilmente atingível. 

Perceber o que pretende o ouvinte e o telespetador, interagir, consultar, compreender os sinais, são ferramentas determinantes para que, nos Açores, a televisão e a rádio públicas passem a ter mais gente a ver e a ouvir. Uma televisão e uma rádio que saiam à rua, que promovam as suas caras e as suas vozes, que lhes concedam tempo para produzir, que reinventem produtos, que não repitam fórmulas gastas de comunicação. Numa palavra e num conceito, que toquem quem os vê e quem os ouve. Porque se não houver ouvintes ou telespetadores, não faz sentido haver rádio ou televisão.

A figura: Osvaldo, o renovado jornalista

Bem sei que é o Diretor Executivo do “Diário dos Açores”. É quase em causa própria que aqui puxo o seu nome como a figura desta semana. Mas Osvaldo Cabral, para lá de um jornalista veterano (com tudo o que a experiência traz de fundamental à nossa profissão…) é um observador e um pensador das questões da comunicação, das novas tendências e da inevitabilidade da adaptação a um “admirável mundo”.

Lançou “Os Açores e os Novos Média” perspetivando, justamente, o que fazer com a reconversão tecnológica, recentrando o papel do jornalista e a necessidade da sua evolução e adaptação. Osvaldo Cabral e Lopes de Araújo (que, curiosamente, foi o apresentador do livro na sua sessão pública, em Ponta Delgada) são dois dos mais valiosos nomes da comunicação social açoriana, por tudo o que fizeram mas, curiosamente, por tudo o que ainda lhes falta fazer, ensinar e “despertar”. Os mais dotados e competentes homens que já passaram pela direção da RTP Açores vieram a terreiro mostrar a necessidade de compreensão, sobretudo por parte dos profissionais da área, do que os rodeia e de como a nova paleta de enquadramentos os desafia. 

Quem quiser apanhar o comboio, que o faça agora. Ele dificilmente parará de novo na mesma estação, e os lamentos de nada servirão. A informação menos piramidal e mais transversal, com o reconhecimento pleno das capacidades, da amplitude e do alcance do trabalho em plataforma, faz agora parte do trabalho de casa de quem, com segurança e competência, quiser continuar nesta indústria.

A frase:

“Quando há erro médico o que é preciso é ‘enterrar os mortos e cuidar dos vivos’”.
A frase de Marta Temido, ministra da Saúde, foi proferida numa entrevista à RTP. Compreendo o sentido final da titular da pasta quando o disse. Mas, justamente porque se trata de um membro do governo com especiais responsabilidades e sensibilidades na área, foi profundamente infeliz no espaço e no tempo. Inabilidade absoluta da ministra da tutela, que deixa margem a múltiplas interpretações e que, no limite, é eticamente reprovável.

Rui Almeida
Jornalista da Deutsche Welle

Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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