Sem governo e sem oposição
A derrocada que estamos a assistir nos transportes aéreo e marítimo de passageiros é o retrato fiel do estado da governação na nossa região.
A degradação galopante em sectores essenciais para as nossas vidas e para a economia regional reflecte o fraco empenho do governo, mas também a falta de empreendedorismo da oposição para preencher o vazio.
A oposição limita-se a fazer diagnósticos, como fazem os comentadores e analistas, mas não apresenta soluções alternativas, nem sabemos como faria diferente.
Estamos a viver o mesmo problema que varre o país: a falta de qualidade de líderes e da elite política.
A oposição está refém dos seus aparelhos e do pequeno ‘inner circle’ que espreita os lugares a distribuir, enquanto o governo prossegue a sua funesta desorientação em paz e sem remissão.
SATA, Atlânticoline, Sinaga, ATA, SPRHI, Lotaçor, Saudaçor e por aí fora, são o espelho do enorme buraco em que já não se consegue sair, apesar de todas as tentativas para apagar ou encenar um mundo em que já ninguém acredita.
Ainda agora fomos confrontados com mais uma realidade impressionante: estamos a perder população por via do saldo migratório, em contraciclo com o país e com a Madeira, o que diz bem da vontade das pessoas em não se quererem fixar nestas ilhas.
Os jovens vão e não regressam e isto tem a ver com o desemprego, que continua a ser elevado nas nossas ilhas, sobretudo entre a classe mais jovem.
A taxa continua a ser encenada com os programas de ocupação, que voltaram a subir.
Em Janeiro deste ano havia 4.301 ocupacionais e em Abril 4338!
Alguém consegue explicar porque é que, afinal, este número está a evoluir em contraciclo?
No Centro de Emprego de Ponta Delgada o número passou de 2.500 em Janeiro para 2.460 em Abril, no de Angra do Heroísmo evolui de 1.104 para 1.217 e no da Horta passou de 697 para 661.
Aqui está um bom assunto para esclarecimento, sem a engenharia do costume, por parte do governo, que nos últimos meses quis encenar, também, a situação das empresas públicas, com uma multiplicidade de comunicados emitidos pelos responsáveis das EPs, que se prestam a tentar ludibriar o público, sabendo que o que estão a fazer é não dizer a verdade relevante sobre as empresas de que são a fachada administrativa.
O padrão da governação, nestes últimos anos, é moldar números e cenários, construindo um mundo em que os cidadãos não se revêem.
E quando a realidade é dura, como está a acontecer nas ilhas do Triângulo, refugiam-se num silêncio impune que é muito esclarecedor.
Há muito que este governo desistiu das ilhas mais pequenas e das gentes mais enfraquecidas.
O que se está a passar no Grupo Central é vergonhoso para a nossa condição de cidadãos ditos autónomos.
Repare-se neste absurdo: o governo apela à iniciativa privada para investir na economia açoriana, os empresários respondem com novos empreendimentos, sobretudo na área do turismo, aprovados pelo próprio governo, que ainda por cima atribui os habituais incentivos e fundos estruturais, e o que acontece depois?
Retira-lhes as acessibilidades, cancela aviões, não programa a tempo os barcos e acumula o falhanço com uma total inabilidade para arranjar soluções rápidas.
Tudo isso é fruto de um modelo que já deu o que tinha a dar, onde só prevalece, agora, o contentamento da máquina da administração pública, bem oleada e untada, para manter a perpetuação do suporte eleitoral.
Basta olhar para o quadro que aqui publicamos e a que tivemos acesso (porque saber as contas desta região é um bico de obra), bem elucidativo das apostas que se estão a fazer no nosso arquipélago.
Trata-se da execução dos fundos comunitários no programa operacional 2020, onde se descobre que os fundos aprovados para o sector público andam à volta dos 67% e para o privado apenas 33%.
Nos 20 maiores projectos, a maioria esmagadora é público.
Ou seja, continua o açambarcamento de recursos para a esfera da influência política directa.
Só o famigerado barco já cativa 40 milhões de euros e gastará 48 milhões para acumular mais défices de exploração, como tem sido até aqui.
São estas as prioridades públicas, enquanto os cidadãos, já desencantados, penam por uma consulta, por um médico de família, por um bom ensino, por um emprego condigno e, também agora... por um barco e por um avião.
Ao que chegamos!
Junho 2019
Osvaldo Cabral
(Diário dos Açores, Diário Insular, Multimédia RTP-A, Portuguese Times EUA, LusoPresse Montreal)
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