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sexta-feira, 26 de julho de 2019

O "artilheiro" e o "saca das bolas"


Do jornal A União -  O "artilheiro" e o "saca das bolas" 

Em tempos de outrora, as festas do Divino Espírito Santo eram bastante concorridas, corolário da falta de outras ocupações. Nessa altura, não se sonhava com discotecas, televisão, bares nocturnos com música ao vivo, enfim, uma série de opções que hoje a juventude (sobretudo estes) desfruta, se bem que, pelo que se vem constatando através das próprias estatísticas, são os adultos que mais vêem televisão. A febre das novelas e por aí fora. 

Ora, naquele tempo, todos nós ambicionávamos que os primeiros quatro meses do ano passassem célere, visto que, em Maio (como ainda hoje acontece, nada mudou nesse sentido), começavam as festas do Divino Espírito Santo, com iniciação na Canadá de Belém, Pico da Urze, Santa Luzia, Terra Chã, Remédios, Outeiro, Caridade e São João de Deus, apenas para falar destes. E as touradas da Canadá de Belém, Pico da Urze, Terra Chã e São João de Deus, sempre aguardadas com enorme entusiasmo. Era bonito ver-se, em quase todas, a presença do “João dos Ovos”, um capinha especialista em passes com o guarda-chuva (se preferirem, também pode ser de sol. Tanto faz...). Mais tarde, apareceram outros, citando, nomeadamente, o “Prosa” de São Mateus. 

Mas, nos arraiais e iluminações das referidas festas, sempre apareciam figuras marcantes, sobretudo para o gosto da petizada e jovens até sensivelmente aos 15 anos. Para além do “Carlinhos Papagaio” trazia as suas ventoinhas multicolores (...) e os habituais vendedores ambulantes (amendoim, tremoços, fava torrada, chupa-chupa, etc., etc.,), tínhamos, também, em cada local onde a festa existia, as figuras do José “Artilheiro” e do “Saca das Bolas”, cunhado do nosso saudoso amigo, José Gabriel Pires dos Santos, vulgo “perna branca”. O José “Artilheiro”, que morava na Rua do Morrão, trazendo os seus deliciosos sorvetes (utilizávamos mais o termo gelado) e o “Saca das Bolas” reunindo à sua volta muita gente que comprava uma ou mais tábuas (cada uma tinha seis números, creio eu) para tentar a sua sorte, visto que, o possuidor do número premiado (que saia da famigerada saca), ganharia uma dúzia de chocolates. Para os mais novos, quando isso acontecia, era uma alegria, na exacta medida em que dava para “adocicar o bico” da namorada ou ainda daquela que era pretendida. E a rapaziada juntava-se em frente ao “Saca das Bolas” (um micaelense que se tornou popular na Terceira, sobretudo em Angra onde vivia) para tirar da saca a bolinha da sorte. Muitas vezes, quem a tirava era contemplado com um chocolate, oferecido, óbvio, pelo premiado. Hoje já nada disso existe. Tudo se modificou com o aparecimento de outros divertimentos e espaços de movimentos nocturnos. É mais cómodo ficar em casa a ver uma partida de futebol na televisão ou uma novela, por exemplo. 

Evidentemente que, quando as filarmónicas entravam no coreto para os arraiais e iluminações, o público, em número considerável, juntava-se em torno do mesmo, observando os gestos dos maestros (Diamantino Ribeiro, senhor Cunha, pai do meu grande amigo Alberto Cunha, Mário Coelho e tantos outros dessa época marcante) e a sintonia dos componentes, mormente quando se tratava de uma música conhecida. E lembro-me que, em relação à Filarmónica da Ribeirinha (que se dizia, por brincadeira, “tocar o mesmo e o mais forte”) prendia a atenção esse grande trompetista de nome José Brincão, não esquecendo o falecido Alberto Benigno, o José “Espadinha” no bombo, o Filili na tarola, enfim, tempos e figuras que não se apagam da nossa memória. 

Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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