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485º Aniversário da Cidade de Angra do Heroísmo

quinta-feira, 26 de março de 2020

Da escritora Graziela Veiga - Carta para a minha filha (Continuação)


CARTA PARA A MINHA FILHA (continuação)

Decorridas duas semanas de quarentena profilática, devido ao Coronavírus Covid-19, nós continuávamos em casa como era recomendado. Os dias tornavam-se cada vez maiores, mais difíceis de passar. Tínhamos que nos reinventar cada dia, a fim de que passássemos o melhor possível. Porém, como eu era asmática, comecei a ter crises de asma, em parte devido ao sistema nervoso, pois embora tentasse disfarçar, estava preocupada, por nós e por todos, sobretudo pelas pessoas que tinham obrigatoriamente de sair.
Naquela altura, no dia em que escrevi esta carta, já havia onze casos de pessoas infectadas aqui nos Açores. Um caso era bem perto de nós, na freguesia de São Mateus.
Eu que ouvia tanto noticiário, naquela época, deixei de ouvir, pelo mal que me estava a causar, pois a situação que se vivia, era catastrófica. Mas ainda retive o caso de dois terramotos ocorridos na Croácia, onde as pessoas que estavam em quarentena, viram-se obrigadas a vir para as ruas, até dos hospitais, nomeadamente o serviço de maternidade. Via-se as mulheres com os bebés ao colo, e outras pessoas que, tentavam a todo o custo, o afastamento das demais, a fim de evitar o contágio. Houve partos que decorreram nas ambulâncias, ao ar livre.
Depois, comecei a ouvir que havia critérios de salvamento em relação à idade das pessoas, nomeadamente na vizinha Espanha e Itália, o que veio assustar cada vez mais, pois a prioridade do uso de ventiladores, era aplicada às pessoas mais novas, com mais futuro pela frente, em detrimento das pessoas mais idosas, com pouca esperança de vida.
Coube-nos a sorte de termos um Director Regional de Saúde, Dr. Tiago Lopes muito competente, que, dia após dia, ia-nos informando da situação, tendo criado um reforço de profissionais de saúde, dado a gravidade do acontecimento.
Desde o início, a maioria das pessoas debatia-se pelo encerramento dos portos e aeroportos, a fim de reduzir o número de infectados, até o próprio Dr. Tiago Lopes, fez um apelo ao "surto da inconsciência e da irresponsabilidade" sobre operadores turísticos que, após o fecho do aeroporto das Lajes, anunciaram operações marítimas para colmatar a suspensão das ligações aéreas. O executivo entrou em contacto com as capitanias dos portos de Angra do Heroísmo e Praia da Vitória para recomendar a interdição destes transportes, o que não veio a concretizar-se, pois a TAP continuava a operar nos Açores, de forma condicionada, ou seja, as pessoas eram obrigadas a responderem a um inquérito 24 a 48 horas antes da viagem, a fim de impedir que o surto se alastrasse no Arquipélago.
Naquele ano, ficaste sempre em casa durante a quarentena. Estavas a frequentar o 9º Ano e até decorria bem. Porém, com a interrupção das aulas, alguns Professores continuaram a enviar trabalhos para casa, via email e alguns testes que foram feitos via directa, em que o tempo era limitado, a fim de responder a um determinado número de perguntas. Até à data em questão, correram muito bem e com sucesso, ou seja, o resultado foi bastante satisfatório.
Devo salientar a atitude de dos estudantes aqui da Ilha e de outras Ilhas dos Açores que, optaram por permanecer lá fora, ou seja, no Continente, durante a pandemia, a fim de não virem infectar as suas famílias e outras pessoas. Louvo aquela decisão, muito sensata, no entanto, como mãe, imagino a aflição que os pais estariam a sentir, visto estarem longe dos filhos naquele período de quarentena profilática, de uma pandemia tão mortífera...
(continua)

26-03-2020
Graziela Veiga
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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