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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Do jornalista João Rocha


Brincadeiras sem vestígios



Num espaço temporal de três décadas quase não encontro resquícios memoriais dos meus tempos de meninice e juventude.
Escrevo sem pieguices. Todas as épocas têm os seus registos próprios e o que há a fazer é viver da melhor forma possível.

Mas, em conversa com amigos, de quando em vez, abro uma fresta da janela do saudosismo. 
Lembro-me vivamente de jogarmos com uma “bola” feita com trapos e sacos de leite. As balizas eram delimitadas por pedras a fazer de postes, enquanto a barra era à altura da imaginação e da conveniência se o eventual golo era a favor ou contrário à nossa equipa.
De resto, em dia de sorte, um esférico a valer era de borracha, já que as de couro limitavam-se aos jogadores a sério. Por vezes, e depois das transmissões televisivas dos europeus e mundiais de hóquei em patins, lá íamos imitar os craques lusos para ruas e travessas com os “sticks” improvisados em toscos paus e, obviamente, sem rodas nas solas das sapatilhas.
Outro divertimento consistia em escorregar, ajeitado o melhor possível em papelões, pela encosta que circunda a muralha do Castelo São Baptista em frente ao Relvão.
Depois, havia tempo e uma imensidão de espaços para atirar o pião, jogar à macaca, brincar ao apanhar e fazer trinta por uma linha.
Uns arranhões, nódoas espalhadas pelo corpo, calçado e roupa danificados representavam apenas pormenores sem qualquer importância (galhetas dos pais à parte) que marcavam sentimentos de liberdade plena.
Era, segundo o que penso e os amigos de então, diversão à grande e sempre com ar puro a servir de atmosfera.
Hoje, as vidas estão dentro dos computadores. Pelo teclado movimentamos tudo o que é necessário para dar andamento à existência, a começar pelo trabalho.
As crianças e jovens de hoje encaram o computador (disponível em várias plataformas) quase como uma extensão corporal.
Um estudo revela que quase 80 por cento dos jovens portugueses entre os 12 e os 18 anos utilizam sistemas de mensagens instantâneas da Internet (Messenger) e seis em cada dez fazem-no frequente e muito frequentemente, passando horas à conversa no computador à conta das redes sociais.
Os seus códigos comunicativos são quase indecifráveis. Todos parecem muito felizes à volta dos teclados, embora as depressões nas idades juvenis subam a um ritmo assustador.
Não sei bem porquê, mas não trocava os meus passatempos infantis por toda a sofisticação atual.
Garanto que era “bué de fixe” brincar com o céu a servir de teto e de olhos nos olhos com os companheiros. 
Mas, nada de juízos de valor e exercícios comparativos. Todos devemos ser livres para teclar a felicidade à nossa maneira...



Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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