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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

República Popular de Angola - Do passado ao presente




Já aqui escrevi, por diversas vezes, que passei por Angola (65-67) ao serviço do exército português. Primeiramente, pela Bela Vista (Distrito do Huambo, cuja capital é Nova Lisboa) e, volvidos nove meses (o tempo que uma mulher tem para dar à luz), fui requisitado pelo Governador-Geral, o Tenente-Coronel Rebocho Vaz (meu grande amigo e que faleceu em Lisboa vítima de câncer), para o seu Gabinete de Imprensa. A indicação-informação partiu do Capitão
João da Paz Laranjo Mourato, que encontrei mais tarde (1982) em Portalegre (sua terra natal) quando eu ia a caminho da Copa do Mundo (82), em Espanha, para acompanhar a Seleção do Brasil (foi aqui que comecei a ter mais paixão por este país). Nessa altura, Laranjo Mourato já estava aposentado com a patente de Tenente-Coronel. Ainda tivemos oportunidade de tomar uma bica (entenda-se por café expresso) e recordar um pouco o tempo em que estivemos juntos em Angola, trabalhando os dois no mesmo gabinete, ou seja, o Sector de Operações. Com ele, lancei no Batalhão de Caçadores 471 o jornal "Os Leopardos", que dava conta, mensalmente, das atividades do Batalhão. Todos os militares descontavam do seu vencimento uma ninharia para a impressão do jornal, numa tipografia em Nova Lisboa. Só assim o jornal sobreviveu. Fiquei altamente feliz por saber que, com a minha ida para Luanda, o jornal continuou com a sua publicação regular. Aliás, eu sempre fiz questão de colaborar com uma matéria de opinião. Bem vistas as coisas, eu fui o "pai da criança" e o Capitão Laranjo Mourato o "padrinho". De resto, todos os outros militares se limitaram a "embalar a criança". E já não foi nada mal... Mais tarde, tomei conhecimento que a minha ida para o QG (nem sempre era fácil atingir esse patamar, ao lado do Governador) foi influenciada pelas boas informações passadas pelo Tenente-Coronel Joaquim Esteves Correia e o Major João Maria Antunes, este último uma figura interessante e que dizia sempre a quem bebia cerveja: "Se beber NOCAL és amigo de Portugal, se beber CUCA, és amigo da UPA" (sigla dos terroristas). Quem se sentava à mesa com ele num bar, já sabia que só podia beber NOCAL.

Há coisas que só passadas e depois contadas tintim-por-tintim, são acreditadas. Só assim mesmo. Tinha eu quatro anos, quando meu padrinho do batismo, irmão de minha mãe e já falecido, veio de Angola onde foi incorporado na primeira companhia de aorianos que partiu para aquela (então) Província Ultramarina, mais concretamente para a cidade de Nova Lisboa, capital do Distrito do Huambo. Na companhia de minha avó materna, também já falecida, acompanhei o desfile da chegada dessa dita companhia e, escusado será dizer, estava radiante com o regresso daquele meu ente-querido. Mais: até imitei os taroleiros (entenda-se pelos homens que tocavam bateria, para se ficar com uma ideia em relação ao termo que se utiliza aqui no Brasil) com os gestos das minhas mãos e me recordo, ainda hoje, que as pessoas achavam muita graça à minha esfuziante alegria. Depois, por uns dias, meu padrinho, para além de exibir muitas fotos tiradas em Angola, falou-me da sua permanência, como foi e, também, das muitas pessoas que lá conheceu, quer através dos jogos de futebol quer através das touradas (numa praça improvisada) que os militares lá realizaram. O tempo passou, fui crescendo, em 1964 incorporado no serviço militar (exercito) e fui, posteriormente, mobilizado para Angola, tendo embarcado em Março de 1965 no Navio Pátria. Ora, mas antes disso, quando me despedi do meu padrinho (nessa altura ainda estava vivo e de muito boa saúde), retornei à conversa antiga, isto é, para que ele me contasse mais pormenores da sua passagem por Angola e, inclusive, me falasse de pessoas. Dito e feito. Como sou uma pessoa de muito boa memória (tudo o que escrevo, na maioria dos casos, é o que ainda está retido na memória, graças a Deus incólume), gravei nomes e episódios. Ironia do destino? Sim, sem dúvida. Na minha primeira fase de Angola, fui parar para a zona do Planalto, exatamente onde meu padrinho esteve. Depois, com o tempo, fui encontrando algumas pessoas (civis que por lá ficaram) que me falaram dessa companhia expedicionária e que, muito naturalmente, conheceram meu padrinho, como futebolista e toureiro. Mais tarde, no Lobito, encontrei um fotógrafo que foi grande amigo do "painho" (era assim que o chamava quando era pequeno, 3-4 anos) e com o qual mantive uma boa amizade. Afinal, esta ironia do destino acabou por ser gratificante para a minha pessoa. Não acham?
Vejamos outra parte:

Já fiz referência que passei por Angola (65-67) ao serviço do exército português. Primeiramente, pela Bela Vista (Distrito do Huambo, cuja capital é Nova Lisboa) e, volvidos nove meses (o tempo que uma mulher tem para dar à luz), fui requisitado pelo Governador-Geral, o Tenente-Coronel Rebocho Vaz (meu grande amigo e que faleceu em Lisboa vítima de câncer), para o seu Gabinete de Imprensa. A indicação-informação partiu do Capitão João da Paz Laranjo Mourato, que encontrei mais tarde (1982) em Portalegre (sua terra natal) quando eu ia a caminho da Copa do Mundo (82), em Espanha, para acompanhar a Seleção do Brasil (foi aqui que comecei a ter mais paixão por este país). Nessa altura, Laranjo Mourato já estava aposentado com a patente de Tenente-Coronel. Ainda tivemos oportunidade de tomar uma bica (entenda-se por café expresso) e recordar um pouco o tempo em que estivemos juntos em Angola, trabalhando os dois no mesmo gabinete, ou seja, o Sector de Operações. Com ele, lancei no Batalhão de Caçadores 471 o jornal "Os Leopardos", que dava conta, mensalmente, das atividades do Batalhão. Todos os militares descontavam do seu vencimento uma ninharia para a impressão do jornal, numa tipografia em Nova Lisboa. Só assim o jornal sobreviveu. Fiquei altamente feliz por saber que, com a minha ida para Luanda, o jornal continuou com a sua publicação regular. Aliás, eu sempre fiz questão de colaborar com uma matéria de opinião. Bem vistas as coisas, eu fui o "pai da criança" e o Capitão Laranjo Mourato o "padrinho". De resto, todos os outros militares se limitaram a "embalar a criança". E já não foi nada mal... Mais tarde, tomei conhecimento que a minha ida para o QG (nem sempre era fácil atingir esse patamar, ao lado do Governador) foi influenciada pelas boas informações passadas pelo Tenente-Coronel Joaquim Esteves Correia e o Major João Maria Antunes, este último uma figura interessante e que dizia sempre a quem bebia cerveja: "Se beber NOCAL és amigo de Portugal, se beber CUCA, és amigo da UPA" (sigla dos terroristas). Quem se sentava à mesa com ele num bar, já sabia que só podia beber NOCAL.

 Um pouco do capitão Laranjo Mourato:

No tempo em que permaneci em Angola (1965-67) cheguei a árbitro de futebol, filiado na Comissão Distrital do Bié e, depois, na Comissão Provincial. Antes disso, fui dirigindo alguns jogos militares (no espaço de dois anos atingi a marca dos 197) entre companhias e batalhões. No meu Batalhão de Caçadores 471, que passou parte no Norte de Angola e posteriormente veio para o Sul, concretamente para a zona de Nova Lisboa, tinha um capitão que foi árbitro de futebol e membro do Conselho de Arbitragem de Portalegre. Chamava-se João da Paz Laranjo Mourato e como eu estava adstrito ao setor do próprio, todos os dias, numa folga, o capitão Mourato fazia de professor e colocava-me algumas questões sobre as 17 leis que regem um jogo de futebol. Confesso que não gostava nada, mas, como se tratava de um capitão que muito respeitava os subalternos, sempre me apresentava com um sorriso nos lábios. Porém, manda a verdade dizer que o dito cujo era fértil a passar rasteiras e em muitas delas eu fui caindo nem patinho. Num dos jogos militares que dirigi na Bela Vista, o capitão Laranjo Mourato foi assistir, mas isso em nada me incomodou, se bem que, ao sair do campo, cruzei-me com o meu colega Mendes (de Santa Maria da Feira) que foi adiantando: “eu estive ao lado do Mourato e ele manteve-se silencioso”, daí eu ter respondido: amanhã vamos ter sermão e missa cantada. Puro engano. Quando entrou no nosso gabinete de trabalho, Laranjo Mourato cumprimentou-me e saiu-se com esta: “na verdade, o meu amigo é melhor na prática do que na teoria”. Volvido algum tempo, veio novamente à tona a arbitragem. Lei pra lá, lei pra cá, rasteiras e mais rasteiras, até que se tocou no nome do meu colega Luciano Calado, de Benguela, e que foi jogador do Vitória de Guimarães. Fui ouvindo, ouvindo, até que, a dado momento, me virei para o capitão “expert na arbitragem” (segundo ele, claro) e comentei: saiba meu capitão que o Luciano Calado está, em relação à minha pessoa, no mesmo patamar, isto é, melhor na prática do que na teoria. E aqui tenho que passar a imodéstia e referir que o Laranjo Mourato ficou calado, virou as costas corretamente e disse-me: agora não há mais lições teóricas, só vou analisar o teu trabalho no campo da prática. Os colegas que estavam comigo também ficaram altamente surpreendidos com esta declaração.

O famoso Duo Ouro Negro

Já aqui disse, por bastas vezes, que não sou saudosista do passado. Se fosse, óbvio, teria saudades do Salazar. Podem crer nisto: mesmo que me torturassem eu não diria semelhante coisa. Se bem que, como vai a política portuguesa, vejo o Salazar “pra lá e pra cá”. Ai se ele volta... Nem quero pensar nisso, nem quero pensar que a PIDE estaria também de volta – mas será que esta atual PJ não é igual à PIDE?

Meus amigos, estou atormentado com o “fantasma salazarista”. Que fazer? Ora, pois, pois, desliguei o computador por alguns minutos e, após o ter reiniciado, continuei com a “hora da saudade”, mas aqui a música é bem outra. É verdade, música, eles “eram de ouro”, tocavam e cantavam como ninguém. Muitas vezes faziam a ponte obrigatória entre Luanda e Lisboa para, de seguida, irem de longada até ao Algarve, para gáudio de outros cantores, atores, futebolistas, jornalistas, políticos (o outro lado da aparição dos fantasmas. Estes os tais...”fantasmas da ópera”. E que ópera...) e ‘tutti quanti” que os admiravam. Nas noites cálidas do Algarve, durante o período das férias estivais, tínhamos, quando as circunstâncias o permitiam, a companhia do “Ouro Negro”, aquela dupla angolana que fez furor por este mundo fora, interpretando músicas de Angola, bem ao seu ritmo, ao seu estilo, com semelhança brasileira. Por isso mesmo, é que os angolanos se deixaram contagiar pelo povo brasileiro. Constatei isso “in-loco”, ou seja, no tempo (23 meses e 24 dias) em que estive naquela ex-colónia portuguesa.

Foi em Luanda, no Cinema Império, que conheci esta dupla humilde e famosa. Eu que, ocasionalmente, era colaborador do Jornal “O Planalto” que se publicava na cidade de Nova Lisboa. Hoje, quando ouço a canção “mamãe África”, arrepio-me todo porque, desde logo, o meu pensamento se vira para o duo Ouro Negro. Que saudades, pois... Saudade, velha máxima do cancioneiro português.

A dupla ficou desfeita com a morte do Miro, elegante no palco, brincalhão por onde passava, enfim, um verdadeiro “gentlemen” que, tal como outros que aqui vou passando, está no meu “baú das saudades”. Um baú sempre aberto para os recordar. Ai Miro, se eu hoje voltasse, presencialmente, a ouvir o Duo Ouro Negro, dava muitos saltinhos de alegria e, concomitantemente, recordaria os bons tempos que passei em Angola, com paragem quase permanente no Cinema Império para os ouvir cantar.

Meu caro Miro, espera-me no “outro lado da vida” e lá poderemos homenagear Angola com a tua inconfundível voz e o brilhante dedilhar na tua viola.

Miro, ai que saudades, ai, ai... Será que as rádios portuguesas já se esqueceram do Duo Ouro Negro? Se o fizeram, vou subscrever o “retorno do Salazar”. Diziam que o ditador gostava desta dupla... Uma meia-satisfação para nós. Porém, não terá bilhete para o espetáculo que vamos realizar no “outro lado da vida”. Com Salazar ao nosso lado, seria espetáculo de insucesso, conquanto o António Oliveira Salazar continue a ser igual a muitos outros políticos portugueses com o seu “pra lá e pra cá.

 Angola no tempo hodierno
Com a saída dos portugueses, Angola esteve à mercê de russos e cubanos. Foi aí que surgiu aquela frase que tem a ver com a língua que é o chicote da vida: afinal, os portugueses é que eram bons.

Depois a guerra interna entre a Unita e o MPLA, situação que foi altamente prejudicial para o povo angolano.
Angola foi-se recuperando mas, atualmente, veio à tona uma enorme crise, aliás, à semelhança do que acontece por esse mundo afora.
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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