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sexta-feira, 10 de março de 2017

Do jornalista João Rocha



Alice, os ricos, os pobres e o amor


                                                                           


É um daqueles romances que se começam a ler e não apetece fazer pausas até chegar à última página (a 217, no caso).
Alice, da autoria do escritor terceirense, com costela jorgense, Manuel Ferraz Cardoso, editado pela Chiado, desperta-nos para as singularidades das vivências açorianas com registo temporal nos anos sessenta do século findo.

Embora um pouco mais novo (nasci na década de 70) também apanhei, nem que seja por tabela, um mundo ilhéu marcado por preconceitos, de variadas índoles, e de presunção de fortuna.
O livro Alice, que narra as venturas e desditas de uma rapariga açoriana, remete-me para o meu universo escolar, onde ter posses financeiras, além do estatuto social, delimitava os territórios.
É uma metáfora de vida, onde são vincadas as diferenças sociais. Embora interagindo (o termo é contemporâneo…) com todos os colegas, à conta de um espírito dado a folias, senti na pele, como aconteceu com os companheiros em igualdade de circunstâncias, o que era ser oriundo de famílias mais humildes em termos económicos.
Os meninos ricos, ou “betinhos” se preferirem, tinham um estatuto diferente, vestiam melhor, não comiam da cantina, eram transportados à escola nos carros dos papás.
Os pobres, como eu, quase carregavam o estigma como Bilhete de Identidade (o Cartão de Cidadão, à época, não passava de ficção científica).
Mas, nada de traumas. Ser menos abonado na carteira também traz vantagens. Aprendemos a ser mais desenrascados, a usufruir da vida com mais sofreguidão.
Sem bola, jogávamos futebol com sacos de plástico ou meias velhas enchidas com papel.
As calças com remendos acabavam por ter o mesmo efeito prático do que as congéneres de marca fina.
E, no que diz ao encantamento feminino, dava um gozo supremo ganhar a corrida aos artolas mais endinheirados. O coração de uma donzela conquista-se sobretudo com lábia e, nisso, os pobretanas levavam uma vantagem quase natural.
No livro do meu amigo e talentoso escritor Manuel Ferraz Cardoso, desde o início estou do lado do personagem Armando na luta pelo amor de Alice.
O doutor Lino Faria é um idiota chapado, que, caso não tivesse nascido com o rabo virado para a lua, tinha uma existência limitada à sua própria inutilidade.
No fundo, o que verdadeiramente conta é o amor. Leiam o livro e perceberão o motivo.

Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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