JORNALISMO EM DESTAQUE

485º Aniversário da Cidade de Angra do Heroísmo

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

De João Bendito em Califórnia

A filosofia 
dos chocolates
A minha companheira de há mais de 42 anos, que já conhece de ginjeira todos os meus apetites, costuma comprar uns chocolatinhos muito gostosos. São o complemento perfeito
para o meu jantar e têm uma particularidade engraçada: estão embrulhados numa prata colorida que traz impressa no interior uma frase "filosófica" que tem o condão de me estragar o jantar porque me faz
pensar e usar a massa cinzenta quando ela quer é descanso.
O chocolate de hoje diz : "Create Peace for Yourself". Talvez possa traduzir como "mantem-te em paz contigo próprio" ou qualquer coisa assim no género. Eu não tenho muitos problemas de consciência, sei que fiz algumas asneiras durante a minha vida e ainda vou fazer muitas mais mas sempre com a certeza de nunca prejudicar ninguém.
É que, realmente, a palavra-chave daquela frase é CREATE (Cria; Faz). A paz que podemos ter nas nossas vidas não cai do céu aos trambolhões. Há que fazer um pouco de esforço, alimenta-la e cultiva-la aos bocadinhos, como quem cuida de uma planta especial. Um famoso treinador de futebol dizia, depois de um jogo em que a sua equipa foi muito afortunada, que “A sorte requer muito trabalho”. Assim é também com a nossa vida. Um pouco de sorte dá muito jeito mas eu acho que vocês vão concordar com o dito treinador. É que precisamos estar preparados para a sorte, do mesmo modo que não devemos descurar os momentos ou situações de azar.
De vez em quando aparecem nos jornais estórias de pessoas que tiveram a felicidade de ganhar milhões na lotaria e, de um momento para o outro, perdem tudo, esbanjam aquilo que, por pouco tempo, lhes trouxe alguma alegria. Seja por má cabeça, por tolices feitas ao desbarato ou seja porque se deixaram enganar por espertalhões sem escrúpulos, o dinheirinho desaparece e ficam com a vida mais cheia de problemas do que tinham antes. Não tiveram o discernimento para aproveitar o maná que lhes encheu os bolsos e só lhes pôs o juízo a andar à roda.
O reverso da medalha também acontece. Gente que penou os olhos da cara, que sofreu no corpo e no espírito os ardumes de doenças graves, de repente sentem-se curadas e prontas para enfrentar o dia a dia com renovadas forças e esperanças. São as leis da vida, quantas vezes imprevisíveis e espontâneas.
Como dizia a frase na prata do chocolate, temos que ser nós próprios a dar-nos um empurrão nas nossas costas, comandar as pernas a saltarem mais alto e mais longe, instruir o desejo e a vontade para que não fiquem estagnados e inertes. Manter a paz interior será um passo dado para conseguir viver em harmonia com os outros. Esta vida são dois dias, não vale a pena andar às brigas e discussões por ninharias que não têm jeito nenhum e só trazem dissabores.
Tenho prazer em dizer que não tenho inimigos. Pelo menos que eu saiba! Se há por ai alguém que não me possa ver nem pintado, pois que me diga, a ver se posso, quiçá, mudar de cor. Aqueles que, no passado, me fizeram algum mal, podem ficar descansados que já mereceram o meu perdão, não lhes tenho rancor.
Desconfio até que quem não me conhece também gosta de mim. É verdade, não sei se será porque procuro manter um sorriso nos olhos ou porque cumprimento todos os que se cruzam no meu caminho, vejo que sou correspondido do mesmo modo. Já fui beneficiado com pequenos actos de simpatia que me deixaram estupefacto. A semana passada, ao atravessar uma das sete ou oito pontes que cruzam as baías na área de San Francisco, o senhor na cabine da portagem deu-me sinal para seguir porque a pessoa que passou à minha frente já tinha pago por mim. E na semana anterior aconteceu o mesmo! Claro que aproveitei a jogada e entreguei as minhas cinco dólares para pagar a portagem do automobilista que me seguia. Pequenas ações de simpatia como estas podem ajudar a levantar o ânimo a alguém que esteja meio desanimado e pôr um sorriso na cara de algum tristonho. Só precisamos é habituar-nos a fazê-las.
Mais um ano está a chegar ao fim. É tempo de fazer revisão, de examinar o que nos saiu bem e o que não correu como esperávamos. De tratar das dores e de agradecer as benesses. De retribuir os favores de que fomos merecedores e dar uma ajuda a quem dela necessita. Com simplicidade, com clareza de espírito podemos ir criando e cimentando a PAZ que nos acompanhará no futuro. A viagem da nossa vida vai continuar, esperemos sem muitos solavancos, porque esta caminhada só fazemos uma vez.
Oxalá a remessa de chocolates não falte aqui no meu armário, tenho que continuar a desembrulhar mais uns e saboreá-los com o mesmo gosto com que me sento por uns momentos a recordar e reviver o passado. Às vezes parece que tudo foi como que um sonho, uma visão.
A minha companheira , que além de me comprar os famosos chocolates é uma leitora inveterada que devora livros a seguir a livros, veio mostrar-me uma citação que encontrou escrita por um poeta indiano que não me conhece de lado nenhum mas que ela acha que reflete aquilo que acabo de dizer:
Look well to this day, for it is Life.
In it's brief course lies all the realities of existence.
For Yesterday is but a memory
And Tomorrow only a vision.
Vive com plenitude o dia de Hoje, porque ele é a Vida.
No seu rápido percurso está toda a realidade da existência.
Porque Ontem já é só uma memória
E Amanhã não é mais que uma visão.
PS. Nem acredito na pratinha do chocolate que desembrulhei agora mesmo. Diz assim:
“Give yourself a standing ovation!”
Sem comentários...
Lincoln, Ca. Dez. 9, 2016 - João Bendito
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

Sem comentários:

Enviar um comentário