A filosofia
dos chocolates
A minha
companheira de há mais de 42 anos, que já conhece de ginjeira todos os meus
apetites, costuma comprar uns chocolatinhos muito gostosos. São o complemento
perfeito
para o meu jantar e têm uma particularidade engraçada: estão embrulhados numa prata colorida que traz impressa no interior uma frase "filosófica" que tem o condão de me estragar o jantar porque me faz
pensar e usar a massa cinzenta quando ela quer é descanso.para o meu jantar e têm uma particularidade engraçada: estão embrulhados numa prata colorida que traz impressa no interior uma frase "filosófica" que tem o condão de me estragar o jantar porque me faz
O
chocolate de hoje diz : "Create Peace for Yourself".
Talvez possa traduzir como "mantem-te em paz contigo próprio" ou
qualquer coisa assim no género. Eu não tenho muitos problemas de consciência,
sei que fiz algumas asneiras durante a minha vida e ainda vou fazer muitas mais
mas sempre com a certeza de nunca prejudicar ninguém.
É que,
realmente, a palavra-chave daquela frase é CREATE (Cria;
Faz). A paz que podemos ter nas nossas vidas não cai do céu aos
trambolhões. Há que fazer um pouco de esforço, alimenta-la e cultiva-la aos
bocadinhos, como quem cuida de uma planta especial. Um famoso treinador de
futebol dizia, depois de um jogo em que a sua equipa foi muito afortunada, que “A sorte requer muito trabalho”. Assim é também com a
nossa vida. Um pouco de sorte dá muito jeito mas eu acho que vocês vão
concordar com o dito treinador. É que precisamos estar preparados para a sorte,
do mesmo modo que não devemos descurar os momentos ou situações de azar.
De vez em
quando aparecem nos jornais estórias de pessoas que tiveram a felicidade de
ganhar milhões na lotaria e, de um momento para o outro, perdem tudo, esbanjam
aquilo que, por pouco tempo, lhes trouxe alguma alegria. Seja por má cabeça,
por tolices feitas ao desbarato ou seja porque se deixaram enganar por
espertalhões sem escrúpulos, o dinheirinho desaparece e ficam com a vida mais
cheia de problemas do que tinham antes. Não tiveram o discernimento para
aproveitar o maná que lhes encheu os bolsos e só lhes pôs o juízo a andar à
roda.
O reverso
da medalha também acontece. Gente que penou os olhos da cara, que sofreu no
corpo e no espírito os ardumes de doenças graves, de repente sentem-se curadas
e prontas para enfrentar o dia a dia com renovadas forças e esperanças. São as
leis da vida, quantas vezes imprevisíveis e espontâneas.
Como dizia
a frase na prata do chocolate, temos que ser nós próprios a dar-nos um empurrão
nas nossas costas, comandar as pernas a saltarem mais alto e mais longe,
instruir o desejo e a vontade para que não fiquem estagnados e inertes. Manter
a paz interior será um passo dado para conseguir viver em harmonia com os
outros. Esta vida são dois dias, não vale a pena andar às brigas e discussões
por ninharias que não têm jeito nenhum e só trazem dissabores.
Tenho
prazer em dizer que não tenho inimigos. Pelo menos que eu saiba! Se há por ai
alguém que não me possa ver nem pintado, pois que me diga, a ver se posso,
quiçá, mudar de cor. Aqueles que, no passado, me fizeram algum mal, podem ficar
descansados que já mereceram o meu perdão, não lhes tenho rancor.
Desconfio
até que quem não me conhece também gosta de mim. É verdade, não sei se será
porque procuro manter um sorriso nos olhos ou porque cumprimento todos os que
se cruzam no meu caminho, vejo que sou correspondido do mesmo modo. Já fui
beneficiado com pequenos actos de simpatia que me deixaram estupefacto. A
semana passada, ao atravessar uma das sete ou oito pontes que cruzam as baías
na área de San Francisco, o senhor na cabine da portagem deu-me sinal para
seguir porque a pessoa que passou à minha frente já tinha pago por mim. E na
semana anterior aconteceu o mesmo! Claro que aproveitei a jogada e entreguei as
minhas cinco dólares para pagar a portagem do automobilista que me seguia.
Pequenas ações de simpatia como estas podem ajudar a levantar o ânimo a alguém
que esteja meio desanimado e pôr um sorriso na cara de algum tristonho. Só
precisamos é habituar-nos a fazê-las.
Mais um
ano está a chegar ao fim. É tempo de fazer revisão, de examinar o que nos saiu
bem e o que não correu como esperávamos. De tratar das dores e de agradecer as
benesses. De retribuir os favores de que fomos merecedores e dar uma ajuda a
quem dela necessita. Com simplicidade, com clareza de espírito podemos ir
criando e cimentando a PAZ que nos acompanhará no futuro. A viagem da nossa
vida vai continuar, esperemos sem muitos solavancos, porque esta caminhada só
fazemos uma vez.
Oxalá a
remessa de chocolates não falte aqui no meu armário, tenho que continuar a
desembrulhar mais uns e saboreá-los com o mesmo gosto com que me sento por uns
momentos a recordar e reviver o passado. Às vezes parece que tudo foi como que
um sonho, uma visão.
A minha
companheira , que além de me comprar os famosos chocolates é uma leitora
inveterada que devora livros a seguir a livros, veio mostrar-me uma citação que
encontrou escrita por um poeta indiano que não me conhece de lado nenhum mas
que ela acha que reflete aquilo que acabo de dizer:
Look well to this day, for it is Life.
In it's brief course lies all the
realities of existence.
For Yesterday is but a memory
And Tomorrow only a vision.
Vive com plenitude o dia de Hoje, porque ele é a Vida.
No seu rápido percurso está toda a realidade da existência.
Porque Ontem já é só uma memória
E Amanhã não é mais que uma visão.
PS. Nem
acredito na pratinha do chocolate que desembrulhei agora mesmo. Diz assim:
“Give yourself a standing ovation!”
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Lincoln,
Ca. Dez. 9, 2016 - João Bendito
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