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sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Figuras que jamais serão esquecidas - "Monstro Sagrado" Natália Correia




ANA TOMÁS 24/11/2015

O 25 de Abril de 1974 e o PREC como a escritora os viu e escreveu, no novo livro “Não Percas a Rosa/Ó Liberdade, Brancura do Relâmpago”.


Há um ano a Ponto de Fuga estreava-se no mercado português com o lançamento da colecção Petzi, um clássico da banda desenhada infantil.Mas já nessa altura Vladimiro Nunes, editor e fundador, tinha intenção de a tornar generalista e por isso queria encontrar um autor que materializasse essa vocação e servisse de porta de entrada para um campo literário mais vasto.


Natália Correia surgiu como uma escolha natural nesse processo: um nome forte, irreverente e com potencial de reconhecimento junto do grande público. Eleito o autor, faltava decidir o que editar no meio de uma obra tão vasta como a da escritora açoriana. “Como já se sentia a aproximação dos 40 anos do Verão quente e daquele processo conturbado que se seguiu à Revolução, percebemos que ela tinha publicado um diário dos acontecimentos da época e ao relê-lo achámos que faria todo o sentido começarmos por aí e recuperarmos esse livro, o “Não Percas a Rosa”.

Esse registo testemunhal que a autora começou a escrever com o 25 de Abril de 1974, e que acompanharia os acontecimentos políticos que agitaram o país até 25 de Novembro de 1975, é uma das duas partes que compõem o livro que a Ponto de Fuga apresenta esta noite no bar lisboeta Botequim, fundado entre outros pela própria Natália Correia, em 1971.

A segunda parte, intitulada “Ó Liberdade, Brancura do Relâmpago”, reúne pela primeira vez as célebres crónicas que publicou nos jornais “A Capital” entre Julho de 1974 e Julho de 1975 (“Crónicas Vagantes”) e “A Luta”, de 1975 a Março de 1976. 
Revelações A editora quis também trazer algo de novo e com a colaboração da investigadora Ângela Almeida descobriu, no espólio da escritora nos Açores, inéditos e manuscritos que complementam o que já tinha sido publicado. “Fomos ver o que seria possível encontrar ali que fosse referente ao diário. Isso levou-nos a um trabalho demorado de comparação entre o livro que saiu e os manuscritos originais e a algumas surpresas. Tentámos organizar a edição de maneira a compararmos tudo o que a Natália pudesse ter subtraído ao livro que publicou”, explica Vladimiro Nunes. Para as crónicas o processo foi semelhante. Depois da consulta dos jornais, a editora foi procurar no espólio da autora textos relacionados que não tivessem sido publicados. “Mais uma vez deparámo-nos com um conjunto de inéditos e reunimos tudo”, acrescenta.

No caso do diário “Não Percas a Rosa”, esses inéditos revelam sobretudo o processo de composição. E embora grande parte do conteúdo do texto dos manuscritos esteja lá, há diferenças, como nota o editor. “Ao fim de três anos – e ela explica isso talvez no último texto do diário –, pegou nos papéis todos e foi relê-los. Fez muitos acrescentos, sobretudo relativos a referências literárias, as partes mais filosóficas e mais densas também foram trabalhadas nessa altura, e fez algumas revisões que são engraçadas.” A título de exemplo, Vladimiro Nunes refere o tratamento que a escritora reservou a Mário Soares, quando escreve sobre o momento em que o político abandona o governo em 1975. “Ela trata-o de uma forma quase messiânica e heróica, que depois no texto final se dilui. Na mesma linha há um outro inédito que é uma intervenção que fez no encerramento da campanha do PS para a Assembleia Constituinte, em 1975, em que não sendo militante dá a cara pelo partido num momento simbólico, dizendo que o PS é o verdadeiro partido português.”

Se na revisão dos textos o tratamento dado aos protagonistas do processo revolucionário serve quase sempre para os tornar mais amargos e desencantados, “e para dar ainda mais cacetada”, com a linguagem acontece o oposto, e a autora suaviza algum excesso usado anteriormente, sobretudo no vernáculo.

“A Natália tinha um sentido estético muito forte, e embora fosse uma escritora instintiva sentiu depois a necessidade de dotar determinados textos de uma dimensão filosófica e de pensamento mais densa. Dificilmente o conseguiria ter feito de imediato. Estavam lá as pistas, mas de certa forma quis posteriormente tornar aquele texto mais elaborado e pensar o livro como um objecto autónomo e um produto final.”

As mais de 700 páginas que compõem o livro são ilustradas com reproduções dos manuscritos originais e fotografias da época, a maioria tiradas por José António Correia, primo da escritora e por quem se diz ter tido uma grande paixão.
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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