Não há Felicidade Solitária
É a fraqueza do homem que o torna sociável; são as
nossas misérias comuns que levam os nossos corações a interessar-se pela
humanidade: não lhe deveríamos nada, se não fôssemos homens. Todos os afectos
são indícios de insuficiência: se cada um de nós não tivesse necessidade dos
outros, nunca
pensaria em unir-se a eles. Assim, da nossa própria enfermidade, nasce a nossa frágil felicidade. Um ser verdadeiramente feliz é um ser solitário; só Deus goza de uma felicidade absoluta; mas qual de nós faz uma ideia do que isso seja? Se algum ser imperfeito se pudesse bastar a si mesmo, de que desfrutaria ele, na nossa opinião? Estaria só, seria miserável. Não posso acreditar que aquele que não precisa de nada possa amar alguma coisa: não acredito que aquele que não ama nada se possa sentir feliz.
pensaria em unir-se a eles. Assim, da nossa própria enfermidade, nasce a nossa frágil felicidade. Um ser verdadeiramente feliz é um ser solitário; só Deus goza de uma felicidade absoluta; mas qual de nós faz uma ideia do que isso seja? Se algum ser imperfeito se pudesse bastar a si mesmo, de que desfrutaria ele, na nossa opinião? Estaria só, seria miserável. Não posso acreditar que aquele que não precisa de nada possa amar alguma coisa: não acredito que aquele que não ama nada se possa sentir feliz.
Jean-Jacques Rousseau, in 'Emílio'
A Verdadeira Liberdade do Homem
Nunca acreditei que a liberdade do homem consiste
em fazer o que quer, mas sim em nunca fazer o que não quer, e foi essa
liberdade que sempre reclamei, que muitas vezes conservei, e me tornou mais
escandaloso aos olhos dos meus contemporâneos. Porque eles, activos, inquietos,
ambiciosos, detestando a liberdade nos outros e não a querendo para si
próprios, desde que por vezes façam a sua vontade, ou melhor, desde que dominem
a de outrem, obrigam-se durante toda a sua vida a fazer o que lhes repugna, e
não descuram todo e qualquer servilismo que lhes permita dominar.
Jean-Jacques Rousseau, in 'Os Devaneios do Caminhante Solitário'
A Culpa dos Males que nos Acontecem
Em todos os males que nos acontecem, olhamos mais
para a intenção do que para o efeito. Uma telha que cai de um telhado pode
ferir-nos mais, mas não nos desola tanto como uma pedra atirada de propósito
por uma mão maldosa. O golpe, por vezes, falha mas a intenção nunca erra o
alvo. A dor física é a que menos se sente nos ataques da sorte e, quando os
infortunados não sabem a quem culpar pelas suas infelicidades, culpam o
destino, que personificam e ao qual atribuem olhos e uma inteligência disposta
a atormentá-los intencionalmente.
É o caso de um jogador que, irritado com as suas perdas, se enfurece sem saber
contra quem. Imagina que a sorte se encarniça intencionalmente para o
atormentar e, encontrando alimento para a sua cólera, excita-se e enfurece-se
contra um inimigo que ele próprio criou. O homem sábio, que em todas as
infelicidades que lhe acontecem só vê golpes da fatalidade cega, não tem essas
agitações insensatas; grita na sua dor, mas sem exaltação, sem cólera; do mal
que o atinge só sente os ataques materiais, e os golpes que recebe podem ferir
a sua pessoa, mas nenhum atinge o seu coração.
Jean-Jacques Rousseau, in 'Os Devaneios do Caminhante Solitário'
Sem comentários:
Enviar um comentário