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quinta-feira, 1 de março de 2018

Os "Monstros Sagrados" jamais serão esquecidos


 A Madame de Jouarre
Lisboa, começos de setembro
Minha boa Madrinha:
 (Continuação)
Adivinho daqui os sisudos ensaios  que  os ditos sociólogos hão de compor,  achando-se na posse de tal informação; e imagino que surpreenderão  os vindouros com títulos tão suculentos como Hábitos alimentares em prisão domiciliar nos começos do século XXI; ou Influência do extra-queijo no Direito Penal e em sua arquitetura jurídica; e ainda, Indigestões de pepperoni em contexto de indagação criminal: novos contributos.  

A minha madrinha sorri, por certo. Mas não deixará de reconhecer que este jovem  que trago ao seu conhecimento é, mesmo contra a sua vontade,  um benemérito digno da nossa efusiva gratidão. Sobejamente a merece ele, que mais não seja pela clareza com  que encerrou o episódio. Perguntado sobre se iria comunicar a impossibilidade de entregar a comida à sua cadeia (de produtos alimentares, como queria dizer a atabalhoada repórter), de pronto respondeu: “Cadeia? Esperem aí, eu não estou preso!”
Porque, por fim, a pizza não foi entregue e o extra-queijo e mais o pepperoni falharam o alvo a que iam dirigidos! Por lamentável esquecimento, faltava àquele Mercúrio das pizzas uma identificação que, bem nítida e bem eloquente, dissesse às forças da autoridade quem ele era de facto.  Deus sabe, terão pensado os espertos guardiões do número 33 e do seu residente, que engenhos e que artimanhas podem esconder-se nas vastas caixas de cartão  que levam as pizzas de porta em porta.
Assistindo a tudo o que bem imperfeitamente lhe narro, uma amiga minha, pessoa de invejável argúcia e dotes domésticos irrepreensíveis, afiançou-me que nada disto tem a verosimilhança de que outrora falava o velho Aristóteles. Segundo ela,  aquele número 33 a que se recolheu a ilustre personagem  estará mais do que fornecido de confortos e de mantimentos. A ser assim,  a entrega da pizza, garante a minha amiga,  teria resultado de uma  montagem não destituída de intenção publicitária.  Quem tal faria? A  cadeia (salvo seja) de comidas? Um provocador político? Um qualquer gracioso desejoso de fama momentânea? Não sei.
O que sei e convictamente sustento é que o meu alegre país está cheio de confortos que  lhe asseguram e a quantos tivemos a ventura de aqui nascer um lugar na História dos povos. Veja bem, estimada madrinha: somos servidos, de forma bem diligente e constante, por escribas e por repórteres preocupados com o nosso divertido bem estar e não com as chagas que a vida moderna reserva aos que a observam com o olhar bisonho dos pessimistas. E se pensarmos (como eu penso)  que os tais periodistas e os tais repórteres mais não são do que a ágil extensão (ou o braço armado, como diria o velho general Sequeira) da incompreendida e estoica “classe política”, então tudo se conjuga para que aqui desfrutemos daquela aurea mediocritas que os Antigos almejavam. Refugiados em debandada, crise demográfica, ameaças terroristas, bancos em rutura, colapso das bolsas, desemprego de jovens (e de adultos!), impostos que nos massacram, desconjuntamentos da velha Europa tudo isso é secundário, se  soubermos gozar a  existência amena que por estas gentes  nos é oferecida, com generoso  altruísmo.
E assim, a despreocupada vida que nos tocou em sorte bem livre está de coisas tenebrosas. Basta que  saibamos entreter-nos com os extra-queijos de uma pizza que errou o alvo! Não entendo mesmo por que razão persistem alguns espíritos  quezilentos em falar dos males que, segundo eles, nos atormentam, sempre ignorando os esforçados trabalhos do bem falante Coelho e do risonho Portas, a bem da Nação. Se mais não alcançar a bondade lusitana, bem merecem eles, no dia que a Providência o destinar,  ser  brindados também com uma pizza condimentada a seu gosto e bel-prazer. E mais: que tal pizza seja entregue, para castigo, por  um dos tais espíritos rabugentos, bem filmado pelos repórteres de serviço, para que a justa penitência  se espalhe e seja conhecida urbi et orbi. Quem sabe, por fim  aprenderão eles que o ódio azedo que destilam só contribui para infernizar os dias dos que nos governam e os de todos aqueles que têm a fortuna de assim ser governados.
Beija-lhe as mãos com  carinho,
Carlos Fradique Mendes

Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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