Acidente natalício
À LAIA DE CONTO
Um grupo de insurreptos, certa manhã, assaltou a freguesia e assumiu a administração
de todas as forças vivas. Invadiram as repartições e quartéis públicos,
expulsaram os dirigentes e passaram a dar ordens de comando.
Toda a
gente ficou espavorida e fugiu dos seus locais de trabalho e residências e
refugiou-se em outras localidades. Foi um autêntico vendaval.
Imediatamente,
os chefes dos inssurreptos assumiram o centro de comando e chefia dos serviços
e expediram as suas ordens aos funcionários que se mantiveram nos seus postos
de trabalho. Os outros, os mais perseguidos, abandonaram a terra que ocupavam.
Os filhos,
porém, solicitavam aos Pais para voltarem aos seus lugares, onde tinham deixado
tudo o que lhes havia pertencido: brinquedos, familiares, e amigos e colegas de
infância, todos com quem haviam crescido, frequentavam as escolas e conviviam
em criança.
Algumas mães escutavam os pedidos dos filhos com mágoa e, em suas orações,
imploravam do Senhor que lhes valesse em semelhantes agruras.
Os mais novos nunca esqueceram o presépio do Menino Jesus: o da sua Igreja, da
sua casa, da sua catequese e da sua escola.
Um dia, porém, tudo pareceu encontrar rumos novos. Ia-se a meio do Verão.
As forças políticas entraram em acção. Aqui e ali iam acontecendo motins
revolucionários, e os chefes desses motins principiaram, em surdina, a
afastar-se para outros lugares.
Durante a noite, tiros de armas de fogo eram disparados, causando o pânico
entre as populações indefesas. Todos estavam à escuta… As mães,
principalmente, ao deitar os seus meninos, rezavam com eles ao Menino Jesus,
cuja festa do nascimento se aproximava, pedindo que viesse socorrê-los, em
momentos tão aflictivos, e que tudo voltasse aos tempos de tranqiolidade e de
ordem.
Certo dia, porém, alta madrugada, forças do Exército vindas de paragens
distantes, invadiram a localidade, ocuparam diversos serviços públicos e
convocaram os antigos funcionários para as chefias e lugares que anteriormente
ocupavam. Tudo foi aparentemente fácil.
Os antigos revolucionários fugiram e os que dali haviam sido expulsos, voltaram
à terra e às antigas ocupações.
A vida citadina começou, vagamente a normalizar-se: a vida religiosa
acalmou-se, as igrejas reabriram-se.
Jorge, um dos filhos das famílias expulsas e regressadas à sua antiga
residência, já um pouco crescido, dirigiu-se à Mãe e perguntou-lhe: -Como é
que isto aconteceu? O ano passado não tivemos nem árvore do natal, nem Missa do
Galo, nem Presépio na nossa casa, e este ano é tudo diferente? O nosso presépio
voltou, na nossa antiga sala vejo muitas caixas com brinquedos e prendas, os
estabelecimentos estão iluminados com muitos produtos natalícios e há todos os
dias festa na Igreja...
Foi-lhe então explicado, a ele e aos irmãozinhos, que aquilo que estava guardado
nos embrulhos era um verdadeiro milagre do Menino Jesus, que assim,
generosamente, atendeu às preces deles e de outros meninos, seus companheiros,
que durante aqueles anos todos os escutara, acabando com a revolução.
Na realidade, as preces dos inocentes meninos foram satisfeitas, naquele e em
anos futuros. Jamais, naquela terra se falou ou houve sinal de qualquer revolta
e todos os seus habitantes passaram a viver fraternalmente e em paz.
Vila Baleeira dos
Açores,
Natal de 2017.
E. Ávila
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