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quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Do jornalista e redator principal do jornal Record RUI DIAS



O homem que prefere ser feliz
O futebol é um fenómeno estranho que, sendo simples e tantas vezes linear, pode evoluir para tremenda complexidade de sentimentos e emoções. Diz-se que o amor à camisola, por exemplo, é um conceito ultrapassado; uma referência de tempos que já lá vão, nos quais o homem estabelecia compromisso eterno entre a atividade e o local onde nascera e era feliz; quando a orgia de sensações de todos os domingos se parecia com as peladinhas de rua do fim do dia, das quais nos sentíamos protagonistas por toda a semana. O crescimento do negócio enquadrou esse jeito de viver; considerou-o uma ingenuidade do passado e matou, aos poucos, a motivação de quem se entregava ao jogo não para ficar rico mas para se tornar vitorioso num Mundo de derrotados sociais. Na visão pragmática do profissional mercantilista de hoje, que tem de pensar nele, na família, no empresário, no advogado e restantes elementos da engrenagem, é raro o futebolista que precise mais de mimo do que propriamente de ouro. 

Mas ainda há casos como o de Nani que, aos 31 anos e com uma longa e brilhante carreira a suportá-lo, agiu como as estrelas de antigamente: decidiu que estava mais interessado em ser feliz do que em ficar (ainda mais) rico. Viu-se numa encruzilhada e optou com a coragem de quem assume um desígnio e lhe infunde a tensão da aventura. O Sporting é hoje um clube abalado por ventos renovadores. Nani é só a prova de que há sempre um momento em que, por mais dinheiro que entre na conta bancária, é impossível viver com falta de ilusões.

O regresso a Alvalade surge depois do pior ano da carreira, não pelos alvores da velhice mas porque os deuses se esqueceram de protegê-lo das debilidades momentâneas do corpo e da estupidez alheia. Esse vendaval de fatalidade resultou na fatura extrema da ausência do Mundial, dois anos depois de ter sido fundamental na conquista do Europeu. A volta a casa, enquadrada por um período negro em Valência e, principalmente na Lazio, não corresponde, assim, a qualquer armadilha inesperada da nostalgia. Tornou-se o destino mais óbvio para quem precisa de afeto e de sentir-se desejado para se expressar na plenitude. Nani foi o príncipe de Ronaldo mas alimentou expectativas que não cumpriu.

Não pretende agora render tributo aos deuses insondáveis do acaso e da memória. Na primeira amostra diante adeptos que o adoram, frente ao Marselha, nem foi bafejado pela inspiração mas sentiu-se impulsionado pelo motor de ambição, orgulho, sedução, entusiasmo e paixão. Sabe que não vem para beneficiar dos louros conquistados noutras paragens; que o tempo não está para acomodamentos e que o seu papel na história será o de chave-mestra do talento escondido; de inspirador da arte e do engenho, que dê coerência a um empreendimento que não pode funcionar como navegação sem bússola e contra a corrente.

O Sporting encerra responsabilidade que a braçadeira na apresentação acentua. O sonho de glória passa pela sua qualidade – e ele sabe-o. Mesmo não sendo conhecido por cumprir todas as promessas que gerou, as implícitas e as explícitas, há dois anos, no Stade de France, é inesquecível a imagem de CR7 sentado no relvado, desesperado, com as lágrimas nos olhos pela despedida prematura da final do Euro’2016. Nani agarrou-se emocionado ao capitão e segredou-lhe a frase mais bela: "Cris, vamos ganhar por ti." Pode hoje não repetir promessas e fazer o que definiu o longo percurso ao mais alto nível do futebol europeu, isto é, manter o perfil silencioso; mas basta olhar para ele, Bruno Fernandes e Bas Dost, mais Battaglia e Acuña, Coates e Mathieu, e quem está ainda na mira, para entendermos que, por trás do aparente atraso para os rivais e da confusão institucional, está lançada a ameaça de um fortíssimo candidato ao título.

Pizzi já atingiu
patamar superior
O Benfica é uma grande equipa quando o maestro está inspirado
Pizzi nunca foi consensual na Luz, mesmo quando jogava ao nível dos melhores da Europa. Herdeiro de uma função desempenhada por craques internacionais como Ramires, Witsel, Enzo Perez e até Matic, houve permanentes reservas entre os adeptos em reconhecerem o patamar a que chegou. Talvez por ser transmontano, de Bragança, nunca foi devidamente reconhecido. Vê-lo nesta pré-época tem sido um regalo. 

Aboubakar vai
descobrir a rota
Os goleadores são, em grande medida, resultado do seu estado de espírito
Aboubakar é um jogador dependente das emoções: quando está bem é capaz de marcar dois golos num remate à baliza, quando está mal, por mais que tente, a bola não entra. Num determinado contexto, essa atitude tem coisas boas porque, quando menos se espera, recupera a pontaria e é um deus nos acuda. De momento, falta-lhe inspiração, alegria e capacidade para dar seguimento aos lances. Nada que dure para sempre.

Hélio Sousa é
clara mais-valia
No futebol fazem falta treinadores pedagogos, que treinem e ensinem jovens
Hélio Sousa voltou a levar Portugal ao título europeu – a mesma equipa em sub-17 e sub-19. Naquele estilo discreto, silencioso e distante de toda a vida, está a trilhar um percurso de sucesso e, mais do que isso, a depurar um estilo e a revelar conhecimentos cada vez mais profundos. É uma clara mais-valia para a FPF e o anúncio formal como treinador que pode aspirar a uma carreira ainda mais brilhante.
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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