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485º Aniversário da Cidade de Angra do Heroísmo

sábado, 2 de março de 2019

Da escritora Graziela Veiga


A SALA DA MORTE! 

Com o passar dos anos, o que nos rodeia provoca-nos um estado de alma nunca antes experienciado. 
Embora já tenha visitado lares de idosos, há anos que não o faço e, fi-lo ontem. Quando soube que uma prima da minha mãe está num Lar de Idosos impôs-se-me o dever de ir visitá-la. Fui acompanhada da minha filha. As idades são tão diferentes, os sentimentos, a experiência de vida, mas o impacto causado foi tão semelhante. 
- Oh mãe! Não sentiste impressão com aquelas senhoras? Fiquei triste. Tu não ficaste? - Claro que fiquei. E não foi pouco. Senti o corpo gelar-se-me, um sentimento de culpa, como se aquelas pessoas estivessem naquele lugar porque nós não fazemos nada por elas. 
É verdade que o fim deve construir-se durante a vida. As pessoas bondosas, que se dão à família, que amam verdadeiramente, jamais deveriam ter um fim tão triste, uma aparência amorfinada, apática, sem solução à vista, que não seja a morte.
Têm limpeza, têm comida, agasalhos, mas não têm o amor da família. A mesma realidade, aqui há anos escapou-se-me, quando fui visitar alguns desses lares. Ontem, não! Pensei, quão triste é, trabalhar uma vida inteira, fazer tudo pelos filhos e acabar num lar, em alguns casos sem ninguém. As pessoas não merecem este fim... Quando nos vêem, os seus olhos cansados e tristes, seguem-nos, como se procurassem alguma esperança, algum conforto e se relembrassem que um dia também já puderam como nós.
Lembrei-me da minha mocidade. O quanto alegres e felizes eram os nossos lares de famílias. Tinham lugar para os avós, pais, netos e porventura alguns tios que, habitualmente costumavam ficar solteiros. Havia convívio entre todos, e ainda tínhamos os primos, por serem criados connosco, eram como se fossem nossos irmãos, pois o bem querer era idêntico. Partilhávamos os mesmos lugares, as mesmas brincadeiras e a mesma comida. Em casa dos avós e tios, sentíamo-nos em casa. Tal era o à vontade e a segurança que nos inspiravam. Eram escolas de sabedoria, educação, aprendizagem e de muita alegria. A vida tinha outro sabor, tornava-se mais fácil...apesar da miséria que havia, (falta de dinheiro), o Amor colmatava essas lacunas.
Quem cuida dos seus e lhes dá atenção, carinho, até à sua partida, deveria ser recompensado pelo Estado. Acredito que, devido à situação em que a maior parte das famílias se encontra, não tenha capacidade de suportar os encargos dos seus idosos, mas se toda a família se juntar, colaborar, toca pouco a cada um e decerto teremos fins mais felizes.
Nunca mais vou esquecer as expressões daqueles rostos... Gostaria que o meu fim não fosse aquele, nem tão pouco o das pessoas que eu amo. 
Temos uma sociedade cada vez mais egoísta, num consumismo desenfreado, sem solução à vista. Sinto pesar e dó dos mais fracos e desprotegidos!
Gostaria de haver uma solução, de forma que acrescentássemos vida aos anos e não anos à vida. É importante viver, é das coisas mais belas, mas viver com dignidade, pois só assim, a vida faz sentido e tem outro sabor. 
Que nos empenhemos todos nesta luta. Se um dia fomos novos, outros seremos idosos, a não ser que morramos novos. 
Sei que não é fácil cuidar de pessoas idosas. É uma tarefa difícil. Ficam sem a noção da limpeza, teimosos e ressabiados. Mas é a nós que nos cabe o papel de contornarmos a situação, dado que estamos na posse das nossas faculdades mentais, por isso, temos que ser tolerantes para com as pessoas idosas. 
Sei que para a maioria é uma utopia. Mas gostaria de regredir ao passado e trazer para o presente e futuro, a oportunidade que a minha geração teve, o convívio entre parentes e as casas cheias, não de mobílias, como acontece actualmente, mas do essencial, de forma que as pessoas sejam os bens mais preciosos que nós temos e os que realmente enchem as casas e o coração de quem nelas habita. 
A vida tem mais valor quando todos têm o seu espaço e se sentem amados! O Amor faz milagres!   ️
03-01-2019
Graziela Veiga


Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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