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terça-feira, 7 de maio de 2019

De Osvaldo Cabral jornalista e diretor do jornal Diário dos Açores - Politica de esgoto


Política de esgoto

O ar que se respira na política portuguesa e na nossa região nunca foi recomendável, mas o dos últimos dias é mesmo irrespirável.

A ingenuidade de Cristas e Rui Rio foi aproveitada pela habilidade profissional de António Costa, provando que a política em Portugal não é para amadores, mas apenas para quem faz dela uma vida inteira, sem nunca ter conhecido as agruras do trabalho.

O que assistimos nestes últimos dias na política nacional não é muito diferente do que vimos provando, há várias legislaturas, aqui na região.

Não é o bem público que está em causa, é quem mais consegue arrebanhar eleitores, custe o que custar. O eleitoralismo acima de tudo.

O PSD e o CDS prestaram-se a um exercício rasteiro de querer abocanhar o eleitorado dos professores, à semelhança do que aconteceu cá, com o Governo Regional nos Açores, quando percebeu que estava a perder uma faixa importante do seu eleitorado e também deu o dito por não dito.

A classe política portuguesa vive permanentemente neste sufoco lusíada de querer agradar a gregos e troianos, ora agindo de uma maneira quando está no governo, ora noutra quando se encontra na oposição.

Tudo isto cansa. 

Os eleitores vão percebendo que o voto já deixou de ser, há muito tempo, a “arma do povo”, porque os governos e os políticos fazem o que muito bem lhes apetece, sem dar troco a ninguém.

Os políticos, no nosso país, estão mais disponíveis para os banqueiros do que para o cidadão comum, que não lhes dá manjedoura.

Felizmente que, no plano nacional, ainda vamos assistindo a um forte escrutínio por parte da opinião pública, sobretudo na comunicação social, enquanto que, na nossa região, tudo é feito sem dar cavaco a ninguém.

Nos Açores temos uma comunicação social fraca (como convém aos Poderes), uma oposição medíocre, um parlamento regional que nos custa 12 milhões de euros sem produzir nada e um Representante da República que bem podia figurar na Constituição como o provedor de croquetes.

Tivéssemos os poderes de fiscalização regional entregues ao Presidente da República - como alguns partidos propõem na célebre Reforma da Autonomia que nunca mais vê a luz do dia - e, conhecendo como todos conhecemos Marcelo, já ele teria intervido na nossa Região, com muitos puxões de orelhas ao poder regional.

Não é só em Lisboa que se promete e, depois, não se cumpre por interpostos calculismos e jogadas políticas.

Aqui, na nossa santa terrinha, cometem-se as maiores loucuras políticas e ninguém é responsável por nada.

Todos nos lembramos de tantos exemplos, a começar pelo sector empresarial regional, um dos maiores cancros que afecta o desenvolvimento regional.
Mas hoje vou dar um outro exemplo, de que muitos já não se recordarão, como prova de que ninguém nos fiscaliza, por maior incumprimento que ocorra.

A 2 de Agosto de 2012 o Vice-Presidente do Governo Regional dos Açores assinou, em nome da Região, um “Memorando de Entendimento entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da Região Autónoma dos Açores”, em troca de um empréstimo de 135 milhões de euros, onde no ponto 6 diz o seguinte: “O GRA (Governo Regional dos Açores) compromete-se a alcançar e manter o equilíbrio financeiro do Sector Empresarial Regional (...). Adicionalmente o GRA abstém-se, durante os anos de vigência do presente Memorando, de adotar ou autorizar medidas das quais resulte agravamento financeiro das empresas públicas regionais”.

E, logo a seguir, o ponto 7, o GRA comprometia-se a “reduzir anualmente o número de trabalhadores da função pública regional”.

Como se vê, há sete anos já se previa o que vinha aí.

E veio mesmo: sem a fiscalização de ninguém, não só não cumprimos o que foi assinado, como fizemos tudo ao contrário. 

Agravamos substancialmente a situação financeira das empresas públicas, ao ponto de falirmos a SATA, a Sinaga, a Lotaçor e já fechamos a ATA, como se anunciou a entrada de centenas de trabalhadores na função pública regional, para agora se preparar, como consequência, uma saída abrupta de pré-reformados.

É por tudo isso que a população está cansada, permanecendo no activo eleitoral apenas a elite que vive do orçamento regional.

Estes sinais dão-nos a percepção de que o sistema partidário está a implodir.

Os partidos que nos rodeiam tornaram-se em fábricas de expedientes e guarida de expeditos prodigiosos.

Já ninguém acredita em ninguém. A desilusão está demonstrada nos elevados índices de abstenção e na fraca participação cívica. Toda a gente foge da política e ela fica entregue aos piores da sociedade.

Junte-se a política de cá com a de lá e temos pouco que se aproveite.
Perdeu-se a política de seriedade e de palavra honrada para obtermos, agora, política de esgoto.

Maio 2019
Osvaldo Cabral
(Diário dos Açores, Diário Insular, Multimedia RTP-A, Portuguese Times EUA, LusoPresse Montreal)
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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