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485º Aniversário da Cidade de Angra do Heroísmo

domingo, 24 de março de 2019

Do jornalista e redator principal do jornal record Rui Dias


Patrício e a lotaria dos penáltis

Vicente del Bosque, antigo selecionador espanhol, campeão europeu e mundial, fez explodir todas as teorias relativas aos pontapés da marca de grande penalidade. Se há quem veja na pena máxima potencial de trabalho para diminuir a incerteza e aumentar a fiabilidade de quem executa a sentença, VdB ignorou qualquer tendência científica. Confrontado com o facto de ter sido Sergio Ramos a rematar o penálti frente à Croácia, não esteve com meias-tintas: "Deixo que sejam os jogadores a decidir quem os cobra. (…) O penálti não é uma ação que possa ser treinada." Armando Nogueira, escritor e jornalista brasileiro, definiu o momento de outra forma: "O penálti é uma sentença de morte em que o carrasco pode ser a vítima." O treino serve para aumentar a precisão do gesto e dar confiança ao atirador mas não permite teatralizar todas as tensões do jogo.

No duelo, o guarda-redes só tem a ganhar, razão pela qual beneficia de jogar para o protagonismo, enquanto o atirador só procura evitar a tragédia. Mas as coisas já não são como Del Bosque pensa. O laboratório futebolístico permite analisar a marcação do penálti a partir de dados concretos. A televisão, por exemplo, ajuda o guarda-redes a antecipar rotinas, virtudes e defeitos dos atiradores. Rui Patrício deixou-o subentendido no final do jogo com a Polónia: toda a atenção no olhar, no local do arranque para a bola, na velocidade, na inclinação do corpo, na corrida ou na posição do pé de apoio. Antes, dizia-se que o guarda-redes adivinhava o lado em 60% das ocasiões. É provável que o número tenha até aumentado. E não só por acertar na lotaria em que, pelos vistos, VdB acredita. Frente à Polónia, RP garantiu estatuto de herói. Como tudo conta nestas coisas, as regras estão lançadas para um futuro desempate. Vantagem de cá.


O que ele sofreu para aqui chegar
...
Tem um corpo irreverente, que não corresponde aos padrões da elegância dos jogadores de futebol; o suor que lhe escorre pelo rosto, como se caísse ao rio a cada 10 minutos, é a metáfora do muito que teve de correr para chegar onde se encontra; o estilo não cumpre os requisitos mínimos exigidos pela estética, porque lhe falta harmonia e proporcionalidade em muitos dos gestos que protagoniza. Marega cria esse primeiro desconforto, o menor dos problemas para quem, não sendo um fenómeno, viu recusada levianamente a possibilidade de afirmar-se no colosso azul e branco. Triunfou no Marítimo e falhou num FC Porto a desfazer-se; deslumbrou em Guimarães e parecia condenado a ser, uma vez mais, figurante no Dragão. Foi então alvo de todos os lugares-comuns: que não tem qualidade; uma coisa é triunfar em clubes menores, outra é fazê-lo nos grandes; é um avançado estrito, de contra-ataque, sem condições para triunfar em equipa de ataque continuado.

Sabemos hoje que era um excelente avançado à espera de uma oportunidade que fosse, também, prova de reconhecimento, confiança e afeto por parte da cadeia de comando. Quando Soares se lesionou aos 32 minutos do jogo com o Estoril, a 9 de agosto, o Mundo pareceu desabar sobre os adeptos portistas. Sérgio Conceição escolheu, em cima do joelho, entre duas opções: alterar o sistema para 4x3x3, colocando um médio (e tem muitos e bons); ou manter o 4x4x2 com uma substituição direta, na certeza de que, então, Marega estava abaixo da dupla-maravilha (Soares/Aboubakar). Prevaleceu a segunda hipótese. Três minutos depois de ter entrado, assinou o primeiro golo da tarde – e ainda marcaria outro. A história de afirmação começou no voto de confiança do treinador.


Marega triunfa por insistência, temperamento, físico, versatilidade e abrangência. Tem características específicas (prefere a bola no espaço) mas conhece as regras (técnicas e táticas) das várias zonas geográficas por onde passa. Ganha terreno por ter impressionante explosão mas, principalmente, pela habilidade com que combina o jogo em progressão, em constante apelo à ajuda dos companheiros. Não exerce com a fantasia de truques ausentes do reportório mas é um furacão quando arranca, em linha reta, rumo ao destino final. Excelente apoio de Aboubakar na zona central, sente-se como peixe na água se tiver de atuar descaído para a direita (em prejuízo de Corona), como sucedeu com Mónaco e Sporting.

Precisou apenas de um treinador para vencer a principal batalha da guerra assumida quando assinou pelo FC Porto: resgatar o orgulho como profissional e usufruir do prazer superior que é jogar na Champions; triunfar numa grande potência sendo útil, titular, goleador e motor de ambição em equipa com olhos postos na glória nacional e no reconhecimento europeu. Tem agora de entregar-se a um trabalho mais detalhado; de estimular correções específicas que lhe clarifiquem competências, lhe permitam interpretar melhor a função e acertar as tomadas de decisão. Chegou a hora de tirar todo o partido do investimento no seu talento feito por ele próprio, pelo treinador e pelo FC Porto.

Bandeira da superação que sustenta o exército de elite comandado por Sérgio Conceição, está obrigado a vencer a instabilidade emocional revelada noutras circunstâncias e ser mais prolongado nos estados de graça; precisa, afinal, de aproveitar a conquista de credibilidade para se fortalecer como avançado, sem se acomodar com o êxito, antes lutando até à exaustão para descobrir os seus limites. De jogador perdido para a causa azul e branca tornou-se, em menos de dois meses, pedra fundamental para a estratégia portista. O primeiro passo está dado. Mais três ou quatro exibições como a do Mónaco e está encontrado um potencial negócio de todo inesperado para os cofres do dragão.


Mathieu notável
frente ao Barça

As imensas dúvidas levantadas no início da época não tinham razão de existir

Mathieu é um defesa superior e só assim se explica que tenha jogado cinco épocas no Valência e, principalmente, três no Barcelona. Fez exibição incrível com os blaugrana, em jogo no qual foi posto à prova em cenário de exigência máxima. O duelo com os ex-companheiros na Catalunha foi tremendo e nem Messi levou a melhor. Tem presença, é inteligente, sabe utilizar a velocidade e tem saída limpa de trás.

Um fenómeno
chamado Jonas


Os números são muito claros: 9 golos em 8 jornadas não permitem dúvidas

Jonas está a passar incólume à crise benfiquista. É um caso à parte, um génio do futebol que resiste a tudo quanto de mau o rodeia – um dia avaliaremos toda a extensão do que representa tê-lo semanalmente nos nossos relvados. O golo madrugador com que lançou o jogo nos Barreiros é uma obra de arte, daquelas só ao alcance dos grandes artistas. Se não deu para ganhar, o problema não foi ele. Nunca é.


O Belenenses
de Domingos

Os generais do banco não devem ser avaliados avulso mas pela sua história

Domingos Paciência chegou à 5.ª jornada com 4 pontos e um coro de contestação nas bancadas. O caso da relação com o Belenenses é um bom exemplo para medir os riscos da avaliação definitiva por um momento específico: é um excelente treinador que só precisa de sentir-se enquadrado no clube e liderar a equipa certa. Os requisitos parecem cumprir-se. Logo os azuis têm ainda muito para dar nesta Liga.
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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