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485º Aniversário da Cidade de Angra do Heroísmo

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Do jornalista João Rocha



 Garrafa a girar por um beijo
                                                                    

Vamos começar por situar as coisas: a minha geração (adolescência registada ainda nas décadas de 80/90 do século findo) passou sem telemóveis (mesmo em versão burra, quanto mais smart), computadores, televisores nos quartos de cama, MP ’s, tabletes e restantes geringonças eletrónicas que fazem as delícias da rapaziada de agora.


A mesada, a existir, destinava-se exclusivamente aos betinhos com os pais endinheirados. Na escola, levámos galhetas constantes dos mais velhos/maiores e ninguém imaginava o que viria a ser o bullying.

Os nossos passatempos não eram, de todo, virtuais. A realidade das brincadeiras afirmava-se em plena rua, a céu aberto, com bom e mau tempo.

Jogávamos à bola que bem poderia ser de borracha, plástico, sacos de leite enchidos com papel e meias velhas. Os postes das balizas eram pedras, camisolas e a barra desenhava-se na imaginação dos jogadores, em geral, e tamanho do guarda-redes, em particular.

Mesmo sendo juiz em causa própria, afirmo em nome da honra coletiva: não éramos miúdos mimados e amaricados.

Brincávamos com canivetes, piões de madeira, pedras e berlindes (abafadores e tudo). Caçávamos melros, dávamos cabo dos rabos das lagartixas, das asas das moscas para servirem de pitéu às aranhas.

O cubo mágico e o Monopólio constituíam os passatempos mais sofisticados, vá lá. Os brinquedos rareavam, mas também puxavam pela imaginação.

Nadávamos às escondidas da vigilância maternal. Os cães seguiam-nos para todo o lado e íamos, a pé, para a escola sozinhos ou, no limite, na companhia dos nossos colegas.

Usávamos roupa velha, de marca indecifrável, sapatos e sapatilhas gastos e nunca receámos arranhões e nódoas negras no corpo.

Um pirolito, acompanhado por um saco de batatas fritas, enchia as medidas do estômago.

Depois de esgotados os prazeres das brincadeiras só com rapazes, chegou a inevitável altura de alinharmos com as raparigas.

Os preâmbulos do engate decorriam em território escolar. Depois, era necessário aprofundar os contactos.

Haviam bailes de garagem, começaram a proliferar discotecas e um slow permitia fixar no tempo a felicidade de dançar com uma miúda gira.

Porém, o mais engraçado, era o denominado jogo da garrafa onde os deuses da fortuna, caso atuassem pelo nosso lado, permitiam sermos contemplados com um beijo na boca de uma rapariga.

A garrafa girava, os corações saltavam, os rostos ruborizavam e passámos a adolescência nisso. Bem vistas as coisas, nem temos nada a reclamar…
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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