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quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Não esquecer um dos meus ídolos - Frank Sinatra


O magrinho no paletó
de grandes ombreiras
Depois que Sinatra se separou de Dorsey foi tudo muito rápido. Houve um contrato de dois meses com o Teatro Paramount, em Nova York, salário de mil dólares por semana. Também a oportunidade de participar de um filme da RKO e de gravar discos pela Colúmbia. Nas noites de sábado, ele cantava no programa Lucky Strikes Hit Parade e, em março de 43, estrearia em um night–club de Manhattan chamado Riobamba. Aqui, um acontecimento curioso multiplicou o nome Frank Sinatra na mídia da época.

Ele cantava no Riobamba, em uma daquelas noites quentes de março, quando uma garota na platéia, particularmente sensível ao calor, sentiu-se mal e teve um desmaio. Foi o suficiente. Logo surgiu o rumor de que a voz aveludada daquele cantor magrinho, metido em paletós de grandes ombreiras, abalava as garotas e provocava síncopes. O rumor foi publicado pela revista Newsweek, e tornou–se verdade.
* * *
Em setembro daquele mesmo ano, 1943, a revista The American Magazine, de Nova York, trazia o seguinte relato de seu repórter Jack Long:
“Se os jovens da costa Oeste são iguais aos de Nova York – e nunca ouvi nada ao contrário – um bando de rapagões de Hollywood vai se sentir abandonado brevemente. Porque, enquanto escrevo, um jovem garoto está a caminho de lá, e ele não é alto nem bonito, mas tem algo que faz com que as garotas o sigam lacrimejando, comportando-se como uma manada, e esquecendo todos os outros homens. Por um olhar dele elas arrancam o cabelo, e por uma foto autografada são capazes de assassinato. Eu as vi em ação, e foi uma experiência incrível.
“Ia andando pela Times Square em uma manhã de sábado, pensando em coisas minhas, quando fui envolvido por uma turbulenta massa humana e jogado da calçada para a rua. Um policial a cavalo trotou em minha direção com o chicote em riste e gritando ‘Volte para a fila, seu…’, e me ameaçando. Veio uma nova onda, mais gritos, e fui despejado no meio da rua outra vez. Daí aproveitei um sinal fechado para o trânsito e cruzei a rua, dando de cara com outro policial.
“– Escute aqui – gritei – sou um cidadão pacífico e, seja qual for o motivo desta demonstração, eu estou fora dela. E, a propósito, o que é que está acontecendo?
“O policial me lançou um olhar infeliz. ‘Estão abrindo as portas para o primeiro show do Teatro Paramount. Tem sido assim nas últimas seis semanas’, acrescentou, lamentando. ‘Todo dia ele canta, e todo dia é assim’.
“Fui embora, mas o mistério me incomodou por vários dias. Frank Sinatra. O nome era familiar, eu o ouvi no rádio sem prestar muita atenção. Mas o que, eu me perguntava, pode trazer cinco ou seis mil jovens para a Times Square, num sábado de manhã, querendo ouvir alguém chamado Sinatra cantar algumas canções?”
O fenômeno era pra valer. Vejamos o relato de Bruce Bliven, na revista The New Republic, um ano depois, em novembro de 44:
“Às nove horas da manhã o Teatro Paramount está cheio e, mesmo assim, a fila para comprar ingressos dá volta ao quarteirão. Mas isso não é nada. Vocês deveriam ver isto aqui na quinta-feira, que foi um feriado. Mais de dez mil pessoas tentavam entrar e 150 policiais de reforço não conseguiam manter a ordem. Vitrines de lojas eram quebradas, pessoas se feriam e ambulâncias as levavam. Os que entravam ficavam para assistir duas ou três apresentações, o que fez com que a confusão fora do teatro durasse o dia todo. Das 3.500 pessoas que estavam em suas cadeiras quando o primeiro show começou, apenas 250 saíram quando o segundo ia começar. Tinha gente na fila desde a meia-noite do dia anterior. Um senhor disse que tentou comprar um ingresso para sua filha oferecendo oito dólares para alguém que o tinha (o preço normal dificilmente ultrapassaria um dólar), mas não conseguiu. Uma senhora, que estava na fila com sua filha horas depois de o show ter começado, disse que a garota havia ameaçado matar-se se tivesse que ficar em casa”.
* * *
Na época, algumas expressões criadas pelas adolescentes de meias soquete que suspiravam por Sinatra passaram a fazer parte de seu dia-a-dia. Swoon (a pronúncia é swúm) é o termo em inglês para desmaio, síncope. Os desmaios eram tantos durante os shows que Frank foi logo apelidado de Swoonatra. As mães das garotas tiveram acessos de cobras e lagartos quando descobriram que suas filhas chamavam seus pijamas de Sinatra Suits (conjuntos Sinatra). Em suas cartas, as garotas substituíram a expressão final, Sincerelly Yours (Sinceramente Sua), por Sinatrally Yours. E, quando preguiçosamente se esticavam em suas camas, diziam que estavam em Sinatrance.
Evidentemente havia os céticos, os críticos que diziam ser tudo aquilo tramado pelos empresários que cercavam os shows de Frank, e os acusavam de pagar pelos desmaios para promover o cantor. Em julho de 46 os jornais publicaram esta nota: “George Evans, assessor de imprensa de Frank Sinatra – que mantém o compromisso de doar mil dólares para a instituição de caridade indicada por alguém que prove que um ingresso, um passe, ou um presente de qualquer tipo foi dado a uma garota para que ela gritasse num show de Sinatra – aumentou a importância para cinco mil, por causa da inflação”.
A febre Sinatra era tão grande que provocava incidentes ruidosos. Em um show em Filadélfia, seis policiais formaram uma ala entre a porta do teatro e o ponto de táxis (ele ainda usava táxis), para garantir que deixasse o local. Eram policiais fortes, massudos. A multidão atacou e, em fração de segundos, ele perdeu o chapéu, o sobretudo, a maleta de viagem, os botões da camisa e vários fios de cabelo. Foi protegido por dois enormes funcionários do teatro, dois cenógrafos, que evitaram um estrago maior. “Duas garotas arrancaram minha gravata e quase me enforcaram” – contou Frank.
Ao chegar à estação estava sendo perseguido por aproximadamente 50 jovens excitadíssimos que vinham em uma fila de táxis. Ele correu para uma lanchonete e conseguiu esconder-se atrás de alguns caixotes de refrigerantes. Quando os garotos perceberam que o haviam perdido, e foram embora, ele saiu do esconderijo e pediu que o garçon lhe desse uma coca.
– Ei – respondeu o rapaz. – Você é Frank Sinatra. Que tal um autógrafo?
E o dinheiro ia chegando. Os números podem parecer modestos hoje, mas considerando-se o dólar na década de 40, era muita coisa. Alguns dados disponíveis referentes a 1944 (previsões feitas em 43): seus shows de rádio para a CBS renderiam seis mil dólares por semana. Os royalties pelos discos seriam de 150 mil, e ele receberia 250 mil por participações em filmes. Por sete apresentações diárias em teatro ele teria 15 mil garantidos, recebendo a diferença se 50% da renda bruta ultrapassasse esse valor – foi o maior contrato já firmado no ramo das diversões até então.

Frank já era chamado, simplesmente, The Voice, A Voz. Difícil dizer precisamente quando o apelido surgiu, mas uma reportagem publicada em Newsweek no dia 20 de dezembro de 1943 já a registrava com naturalidade, ao relatar dois incidentes do cantor com suas Sinatra Swooners (aproximadamente, as Desmaiadoras de Sinatra): “A Voz mesmo teve de dizer–lhes que se calassem em um show. A algumas mães de fãs mais exaltadas foi pedido que mantivessem suas filhas em casa”.
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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