A MESA DE QUEM MANDA
Para se saber quem realmente manda numa empresa ou numa
repartição é preciso examinar as mesas. Quanto mais cheia a mesa, menos o seu
ocupante manda. Quanto mais limpa a mesa, maior a autoridade. O chefe que se
queixa
de que sua mesa é tão confusa quanto a de qualquer subalterno e nem por
isso ele manda menos, deve se precaver. Em algum lugar da sua organização há
alguém atrás de uma mesa vazia que parece não estar fazendo nada. Provavelmente
é este quem manda. Quanto maior a mesa, maior
a hierarquia. Mas não é o tamanho da mesa que determina o status. É que, quanto
maior a mesa, maior e mais conspícua a superfície limpa. Até um interfone sobre
a mesa é um sinal de fraqueza. Quem realmente manda não precisa se
intercomunicar. Quem realmente manda não precisa mandar!
Mas tem uma fantasia que eu cultivo. A de um dia chegar à maior
autoridade de todas, alguém que esteja mesmo por trás de tudo - Deus, por
exemplo, - e descobri-lo sentado atrás de uma velha escrivaninha coberta de
diagramas, relatórios e planos para o futuro, batendo impacientemente nos
papéis com a palma da mão e dizendo:
- Cadê a minha Bic?
Ele derruba a garrafa térmica e derrama café em cima dos papéis,
do cinzeiro cheio, etc. Toca o telefone e ele grita para a secretária:
- Dona Solange, eu só estou se for o Papa.
TIA INEZ
Sempre imaginei como o mundo reagiria a uma prova da existência
de seres extraterrestres. Na literatura e no cinema seres de outros mundos são
sempre de civilizações superiores à nossa, mesmo que tenham a pele ruim, e nossa
reação diante deles é sempre de pânico. Imaginamos que se não nos arrasarem com
seus raios de morte nos arrasarão com sua superioridade moral. Mas que
transformação provocaria, mesmo, no pensamento humano o aparecimento de algo
remotamente parecido com a tia Inez em Marte ou em uma das luas de Saturno?
Chegaríamos mais perto de uma consciência de espécie, da idéia do nosso planeta
como uma nação comum a todos, ou cairíamos num tribalismo supersticioso ainda
maior?
É por isso que olhamos as fotografias mandadas de Marte pela
sonda da NASA sempre esperando ver um rosto nos olhando de volta. Dois olhos
curiosos numa cara reconhecidamente animal - ou um olho, ou vários. Enquanto
uma daquelas sombras não se mexer e revelar que tem pernas os feitos da NASA serão
grandes acontecimentos científicos mas não grandes êxitos de público. Falta a
referência afetiva. Falta a tia Inez.
Por enquanto as prospecções da NASA servem apenas para mais
divagações sobre a estranheza do Universo, essa coleção de esferas soltas no
espaço sem motivo humanamente discernível. Por enquanto estão transmitindo
apenas outro aspecto do desprezo da matéria por nós e pela nossa perplexidade.
Falta uma perplexidade parecida nos olhando de lá. Falta um olho piscando.
Falta um cachorro passando no fundo. Qualquer coisa que não seja indiferença
para todos os lados. Um dia uma daquelas pedras sai caminhando, e aí eu quero
ver.
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