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sábado, 23 de março de 2019

Do jornalista Rui Almeida


“FAROL DE NEVOEIRO” – 24 março


A evolução para as plataformas (e o exemplo da RTP Açores)


Dez anos de trabalho no estrangeiro, sobretudo numa indústria como a comunicação social, em permanente evolução e mutação, conferem-nos uma equidistância que só mesmo essa experiência pode trazer.

A visão de perspetiva que permite separar o trigo do joio, enquadrar opções estratégicas, verificar o cumprimento de premissas de serviço público, analisar comportamentos e atitudes dos protagonistas, avaliar o mercado e os posicionamentos dos diversos “players”, não sendo exclusiva de quem tem ( e infelizmente são poucos, muito poucos) a possibilidade de integrar outras estruturas, outras equipas, outras formas de encarar a atividade dos “media”, é, porém, com essa realidade, muito beneficiada.

Há um distanciamento físico e de rotinas, de maneiras de ser e de agir que permite perceber métodos e fórmulas de ação. Ou inação. Já por diversas vezes foquei nestas colunas o quão grave se torna o “hábito” muito português de não responder atempadamente, de guardar para amanhã o que se pdoe resolver no momento, de pensar que “o tempo é bom conselheiro” e, portanto, é melhor deixar pousar o pó sobre as mesas para depois se tomar decisões. Em determinada medida, mais estruturante, mais profunda, esta é, efetivamente, uma estratégia correta. De um modo mais prosaico, no imediato, nada há de pior do que se enviar um “mail” sem resposta, do que telefonar e não ter retorno, do que escrever uma simples mensagem e não obter “feedback”. 

E há um entendimento global. Sobretudo, a perspetiva de que a comunicação é cada vez de todos, para todos e em cada momento. Não é adiada ou congelada, não é faseada ou rarefeita. É ampla, cruzando-se em diversos sentidos e permitindo interações há alguns anos impensáveis, pelo imediatismo e pela profundidade. Mas, e sobretudo pela elevadíssima capacidade de penetração dos produtos digitais, tornando cada vez mais heterogénea, volátile variável a potencial audiência e os consumidores finais, é fundamental cuidar da estratégia de desenvolvimento da comunicação em rede.

Detenhamo-nos sobre o exemplo que agora nos é dado pelo Centro Regional dos Açores da Rádio e Televisão de Portugal. Negligenciadas durante largo período, as plataformas voltaram à ordem do dia, no segundo piso da Rua de Castelo Branco, em Ponta Delgada. Com uma mudança interna que tornou a componente multimédia da responsabilidade direta do subdiretor Rui Goulart (em conjunto com os meios e os conteúdos). Um acréscimo de responsabilidades para um dos melhores “quadros” atuais da RTP nos Açores, mas que diz bem da sensibilidade e do cuidado (ou, pelo menos, da intenção de cuidar) do responsável em relação a áreas que jamais, nos atuais enquadramentos, devem ser esquecidas ou menorizadas. 

Dou, sempre, o exemplo que melhor conheço, neste campo, o da Deutsche Welle (DW), a estação internacional da Alemanha, cuja “camisola” visto há cerca de dois anos: do ponto de vista conceptual, a administração da “pública” germânica determinou que rádio, televisão e digital estejam em plano de igualdade absoluta na estratégia, nas abordagens e na importância e prioridades práticas da DW. Resumindo: nenhum dos meios se sobrepõe em termos de opções orçamentais ou de atenção e privilégios. É uma forma, reconheço, pouco habitual e muito “progressista” de colocar no mesmo tabuleiro as três dimensões da comunicação da empresa. Mas é a única que, no médio e longo prazo, permite o estabelecimento de objetivos globais consistentes e, no curto prazo, a criação de equipas multidisciplinares que abarquem, na prática, a destreza e o conhecimento práticos dos três meios. Que, no caso da Deutsche Welle, se assumem intitucionalmente como complementares e interdependentes.

Este é o princípio que, creio, norteia o relativamente recente subdiretor da RTP A, embora, claro, com as óbvias e necessárias adaptações em termos de espaço, tempo e recursos. E, neste particular, os “recursos” são muito mais do que os financeiros. São os humanos que interessam. É a capacidade de perceber o que está para além do óbvio e do corriqueiro. É o risco de poder sair das imensas zonas de conforto em que muitos dos profissionais da RTP A estacionam, há longo tempo. É, também ou sobretudo, a vontade de o fazer, de se adaptar, de se reciclar, de evoluir. Tenho as minhas (fundadas) dúvidas que Rui Goulart encontre em todos a mesma recetividade. Mas o simples facto de ter aumentado e agilizado a presença da rádio (Antena 1 A) e da televisão (RTP A) públicas nas plataformas sociais de referência, de tentar motivar e alertar para a necessidade de uma maior interação e de, ele próprio, estimular os profissionais nesse sentido, é claramente um bom sinal.

Falta alguma formação e estratégia. Falta definir – como se do básico de uma notícia se tratasse... – o quê, como, com que meios e ângulos de abordagem deve ser filtrado para a plataforma que, hoje, assume a liderança nos consumos de “media” audiovisual no planeta: a internet. O caminho faz-se caminhando, e todas as grandes conquistas começam por um pequeno passo. Já deu vários, o subdiretor da RTP Açores. Faltam ainda muitos, que dependem, em parte, dele próprio, da sua capacidade de aglutinar atenções e motivar equipas. Mas o principal tem de ser dado por todos os profissionais da casa. E esse, sendo mais difícil e mais demorado, tem tudo para ser, também, mais aliciante no seu resultado final.

Rui Almeida
Jornalista da Deutsche Welle
Carlos Alberto Alves

Sobre o autor

Carlos Alberto Alves - Jornalista há mais de 50 anos com crónicas e reportagens na comunicação social desportiva e generalista. Redator do Portal Splish Splash e do site oficial da Confraria Cultural Brasil-Portugal. Colabora semanalmente no programa Rádio Face, da Rádio Ratel, dos Açores. Leia Mais sobre o autor...

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