Uma fera na esquerda recuada
...
Da esquerda recuada do palco, lugar que, por norma, acolhe figurantes escondidos, sem interferência na grande história, irrompe uma fera que, muitas vezes, chama todas as atenções e torna-se protagonista da peça. É um visionário que não antecipa logo a extensão da hecatombe que pode provocar no jogo e na plateia; é um agitador que parte incógnito e chega com nome próprio – Alex Telles, 24 anos, brasileiro, lateral-esquerdo com talento que excede em larga medida o referencial técnico da função que desempenha. Foco de rebelião permanente na área sob sua jurisdição, assenta num vasto reportório ofensivo a partir de perfeita coordenação motora com bola: é temível nos duelos individuais, dos quais sai vencedor por técnica mas também por insistência; na capacidade para progredir em ações combinadas; no drible, no instinto, na visão periférica e na precisão depurada com que executa cruzamentos ou mesmo passes fatais já em zonas mais próximas da baliza.
Na segunda época ao serviço do FC Porto, Alex Telles acrescentou argumentos táticos ao excelente lateral que já era quando chegou. No Dragão tornou-se melhor jogador, o que, sendo normal para quem está em boa idade para evoluir, revela um homem aberto a acumular informação e que não deu por concluído o processo de crescimento que ainda está longe do fim. Mais do que melhorar a definição do último passe, ganhou sentido de orientação nos movimentos de luta pela bola; no apoio aos centrais; na avaliação das distâncias e das marcações; no modo como protege as costas e se está a fortalecer nas rotinas de decisões automáticas – raramente falha nos momentos mais inesperados, logo mais complexos e relevantes, em que a equipa se encontra desequilibrada e à mercê do adversário.
Alex Telles está a aproximar-se da harmonização necessária à construção de um lateral-esquerdo completo, sólido, fiável e fraturante em que pode vir a tornar-se. Nas pernas tem o turbo que lhe facilita o arranque, a travagem e a mudança de velocidade; no peito revela a resistência necessária para correr, durante hora e meia, de trás para a frente e da frente para trás; no cérebro leva ideias claras e objetivos definidos para concluir tudo aquilo a que se propõe. É rápido e preciso nos gestos; contundente à chegada e primoroso à saída, isto para lá de não deixar a agressividade órfã da inteligência – sejamos compreensivos e entendamos a expulsão com a Juventus, na Champions de 2016/17, como um ato isolado e irrepetível. É impressionante como desarma à entrada da área e vai concluir o lance do outro lado do campo, transformando-se de defesa em avançado em poucos segundos. Pelo caminho, é o ator principal de algumas curtas-metragens inesquecíveis, nas quais acelera e trava; choca, cai, levanta-se e arranca outra vez; resolve sozinho mas não tem vergonha de pedir ajuda, evitando sempre erros prematuros, geradores de contra-ataques perigosos do adversário.
Será menos influente do que Fábio Coentrão e menos habilidoso do que Grimaldo (resolve em espaços mais curtos), para falar dos laterais-esquerdos de topo na Liga. Mas é um especialista que está a refinar qualidades e a apetrechar-se com quase todos os elementos de que precisa para encerrar a construção de um jogador apetecível no grande mercado europeu. Nele coincidem virtudes como solidez e atrevimento; coragem e lucidez; calma e exuberância; rotina e aventura. Está agora a entrar na maturidade plena sem beliscar qualquer dos argumentos físicos que o caracterizam. Certo que, no escrete, tem a concorrência do melhor defesa-esquerdo do Mundo (Marcelo). Mas, porque são precisos dois e às vezes três jogadores para cada posição, será sempre candidato a ter em conta naquela que é a reserva espiritual do futebol. Quando pensar no Mundial da Rússia, o Brasil não deve perdê-lo de vista.
O grande recital de Rúben Ribeiro
Com o Sporting, puxou dos galões e foi dono do jogo. Nem mais nem menos
Rúben Ribeiro chega aos 30 anos com qualidades intactas e os sinais indiscutíveis de um génio do futebol. A carreira desmente a essência do recital magistral que deu no duelo com os leões e remete logo para as culpas que teve no cartório. Teve-as por certo. Mas quantos treinadores se cruzaram com ele e o desaproveitaram escandalosamente? O desperdício (crime) é claro. E não tem só um responsável.
Gonçalo Silva cada vez melhor
Começou por ser um jogador complementar no eixo defensivo do Belenenses
Gonçalo Silva entrou no Restelo em 2015/16, quando os azuis sofreram a exorbitância de 66 golos (pior registo de sempre). Hoje é titular absoluto, capitão de equipa e um dos centrais mais fiáveis e completos da Liga. Aos 26 anos, está a caminho do auge das imensas qualidades que possui, como ficou provado no embate com o Moreirense, no qual, à semelhança de muitas outras ocasiões, foi quase perfeito.
Heldon recupera aura de talento
Num estalar de dedos tornou-se a estrela desequilbradora do V. Guimarães
Heldon sempre foi um jogador interessante mas o balão, em vez de encher, foi perdendo gás. O modo como se está a exibir sob o comando de Pedro Martins recupera a aura do jogador explosivo, talentoso, influente e bem relacionado com o golo. Nas Aves, onde o Vitória venceu pela primeira vez na condição de visitante, foi um diabo à solta, que jogou e fez jogar; marcou e deu a marcar. Cuidado com ele.
Sem comentários:
Enviar um comentário